Opinião - Spartacus: Blood and Sand

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A série "Spartacus: Blood and Sand" é o único sucesso do canal Starz até o momento. O pequeno canal a cabo começou a investir na produção seriada para tentar entrar nesse mercado e competir com as produções de canais como AMC, HBO, Showtime, FX, TNT e outros. Começou com "Head Cases", passou por "Crash", chegou à "Party Down", sem conseguir uma repercussão de público ou crítica.

Então veio "Spartacus", série filmada na Nova Zelândia que tem como produtores os mesmos responsáveis por "Hércules" e "Xena,a Princesa Guerreira". A resposta de público tem sido o grande estímulo do canal que esse ano já anunciou a produção e compra de projetos que também retratam histórias de épocas passadas, como é o caso de "The Pillars of the Earth", minissérie produzida na Alemanha que já tem a continuação engatilhada; e "Camelot", que narra a lenda do Rei Arthur, muito embora o projeto tenha sido divulgado como uma adaptação para os tempos modernos. Ainda assim, prevalece a trama.


A história de Spartacus é real; tendo vivido em uma época anterior a de Cristo, Spartacus era um guerreiro que foi capturado, vendido como escravo e transformado em gladiador. Posteriormente liderou uma revolta formando um exército de gladiadores que enfrentou Roma, na época envolvida em duas guerras, uma na Espanha e outra, a mais importante, que ocorreu entre Roma e a Ásia Menor, chamada de Terceira Guerra Mitridática. Em função disso, o Império Romano não se preocupava com conflitos internos, o que proporcionou o avanço de Spartacus e seus homnes. Afora esse registro histórico, pouco se sabe da vida de Spartacus, o que permite a roteiristas a liberdade criativa em desenvolver o personagem e roteiros que melhor lhes convier para a produção de um filme, minissérie ou seriado.

A produção mais famosa e aclamada ainda é o filme de Stanley Kubrick, produzido em 1960 e estrelado por Kirk Douglas. Tendo como base o livro de Howard Fast, o roteiro foi desenvolvido por Dalton Trumbo, que somente teve seu verdadeiro nome incluído nos créditos por exigência de Douglas, que além de ator também era o produtor. O motivo para Trumbo usar um pseudônimo era porque ele tinha sido incluído na lista negra anticomunista do governo, a qual levava os profissionais listados a perderem seus empregos e caírem em desgraça.


Apesar dos problemas entre Kubrick e Trumbo, o filme entrou para a história cinematográfica americana tornando-se um cult. Por isso mesmo, quando, de tempos em tempos, se fala em produzir um remake, cinéfilos se revoltam. Já foram produzidas versões italianas, francesas e russa de Spartacus para o cinema; para a televisão, existiram poucas versões. Entre 1985 e 1987 foi produzida na França uma série animada, vagamente baseada na história desse personagem, que recebeu o título de "Spartacus and the Sun Beneath de Sea". Em 2004, um telefilme com duração de minissérie de três episódios, foi produzido pelo USA Network, tendo como personagem principal o ator  iugoslavo Goran Višnjić, de "Plantão Médico/ER".

Cinco anos depois, estreia pelo canal Starz a série "Spartacus: Blood and Sand". A produção busca conquistar os fãs dos video games de ação. Utilizando o mesmo recurso técnico explorado pelo filme "300", a série tem como base as cenas de violência, sangue e insinuações de sexo. Logo no início de cada episódio, aparece um aviso para o telespectador, informando-o de que o conteúdo a ser apresentado poderá ser chocante.


No entanto, quem assistiu à série "Roma", da HBO, produção que se equipara pelo período retratado, verá que existe uma diferença muito grande entre as cenas de violência e sexo exploradas por ambas as séries. Enquanto que em "Roma" o artificial se mescla com o real, em "Spartacus", a artificialidade estética transforma as cenas em violência comparável àquelas vistas em desenhos animados adultos. O abuso dos efeitos especiais nas cenas de ação e violência, se contrapõe à proposta de crueldade da série, tornando sua abordagem e seu conteúdo visivelmente irreais. Dessa forma, as cenas mantém um distanciamento seguro entre conteúdo e público.

Por outro lado, a série se propôs a explorar a cultura sexual da época, algo louvável, pois, assim, trabalha um importante aspecto histórico que a trama oferece. No entanto, ela é vista apenas nos primeiros episódios, sendo abandonada pouco depois. Além disso, as cenas não ultrapassam o aspecto estético da insinuação do ato ou desfile de mulheres com seios à mostra.  Assim sendo, tanto as cenas de ação quanto as de sexo, se mantém a um nível seguro, existindo sem de fato existirem. Quem assistiu à série "Tell Me You Love Me", também da HBO, poderá ter uma noção da diferença de abordagem para o mesmo ato sexual. 

A série oferece uma boa trama, a qual poderia ter se saído criticamente melhor se seu conteúdo e personagens tivessem sido desenvolvidos com mais profundidade, algo necessário para compensar o excesso de artificialidade oferecido pelo visual das cenas de ação e pelos cenários.

O texto abaixo contém spoilers!


Nessa primeira temporada temos a trajetória inicial de Spartacus. Ao longo de 13 episódios, vemos um soldado ser transformado em escravo, passando pelo treinamento para se tornar gladiador; sua recusa em obedecer, o que o leva protagonizar lutas inglórias fora das grandes arenas; seguida de sua ascenção como gladiador, a descoberta daqueles que o traíram, finalizando com a revolta contra aqueles que o mantém prisioneiro.

No primeiro episódio, Spartacus (Andy Whitifield) é traído por Glaber (Craig Parker), um oficial romano, que o transforma em escravo, separando-o de sua esposa Sura (Erin Cummings). Spartacus é vendido à casa de Batiatus (John Hannah), um homem ambicioso que mantém uma escola de gladiadores a qual domina os jogos locais. Ele logo cria inimizade com Crixus (Manu Bennett), o principal gladiador e herói que representa a casa na Arena. Recusando-se a fazer parte dos jogos, Spartacus também cria antipatia com os demais gladiadores, que vêem na escola e na Arena, suas chances de glória e orgulho. Seu único amigo é Varro (Jai Courtney), um jovem que se tornou gladiador para pagar as dívidas de jogos de azar. Aos poucos, Batiatus conquista a confiança de Spartacus, prometendo-lhe reuni-lo com sua esposa, em troca de sua lealdade à ele e aos jogos de Arena.


Em paralelo à história de Spartacus, temos a de Crixus que, como escravo, é obrigado a manter uma relação sexual com Lucretia (Lucy Lawless), esposa de Batiatus, embora seja apaixonado por Naevia (Lesley-Ann Brandt), escrava de Lucretia. A esposa de Batiatus é uma mulher ambiciosa, que deseja ver seu marido entrando na classe alta da sociedade. Para tanto, manipula Ilithyia (Viva Bianca), filha de um Senador e esposa de Glaber, oficial que escravizou Spartacus. A jovem é outra cobra venenosa, que se deixa manipular, mas que em seguida, ou na primeira oportunidade, dá seu bote.

Trata-se de uma trama típica de novela, com personagens desenvolvidos superficialmente, carregando seu status de 'preto e branco' ou 'mocinho e bandido'; a história explora a luta de classes, com os patrões representando os bandidos, e os empregados/escravos, na posição de mocinhos, com exceção de Ashur (Nick Tarabay), que é um escravo, mas que está na posição de patrão por ter se tornado o homem de confiança de Batiatus. 


Restrita a esse grupo de personagens, a série limita a história a um mesmo espaço. Depois que Spartacus entra na Casa de Batiatus, o público passa a viver com ele, aprisionados naquele ambiente, saindo apenas para assistir aos jogos de arenas, vendo sempre as mesmas pessoas perseguirem seus objetivos, repetindo seus atos e diálogos. A limitação de espaço não é, de fato, um erro ou um problema. Mas, ao se optar por esse tipo de narrativa, os roteirsitas teriam que verticalizar a trama e seus personagens, ou seja, aprofundá-los, criando-lhes propósitos que possam ser desenvolvidos de forma autônoma dentro de um espaço limitado. O que vemos são personagens que aparecem quando necessário, reagindo de forma que uma determinada cena ou situação possa existir.

A história se intercala entre cenas na casa de Batiatus, no porão (onde ficam os escravos e a escola de gladiadores) e na Arena. Não há aproveitamento de outros cenários, nem de personagens periféricos, cujas personalidades somente são conhecidas quando estes vão até o ambiente retratado. Assim sendo, com exceção de uma ou outra cena, não acompanhamos o dia a dia de Ilithyia e seu marido, ou sua convivência com família ou amigos, nem tão pouco conhecemos a intimidade dos inimigos de Batiatus, ou dos Senadores, ou a vida de Aurélia (Brooke Williams), esposa de Varro.

Eles são personagens cujos sonhos, desejos, objetivos, opiniões, e sentimentos desconhecemos, pois, com exceção de Ilithyia, não foram explorados. Tudo o que sabemos deles é o que foi mostrado quando eles se dirigiram ao cenário retratado na trama, ou quando os personagens desse ambiente se dirigiam a eles em raras cenas que vemos nas ruas da cidade. Dessa forma, esses personagens ficaram à merce dos roteiristas para serem utilizados como peões sempre que são necessários para que a história tome um rumo, não lhes foram dadas vidas próprias.

Temos como exemplo o episódio 9, no qual Ilithyia mata Licinia (Brooke Harmon), prima de um Senador. Tudo indicava que a série conseguiria tomar um novo rumo a partir dali, no entanto, no episódio seguinte, a narrativa continua restrita ao cenário da casa de Batiatus. Uma mulher da importância de Licinia desaparece e a série não acompanha as consequencias do fato, ele é, quando muito, mencionado pelos personagens com os quais já convivemos.


Muitos poderão argumentar que a ideia dos roteiristas era levar o público ao aprisionamento, para que se pudesse ter uma noção do que Spartacus vive e, assim, acompanhar o crescimento de sua revolta. Mas, para que isso pudesse ocorrer, não poderíamos conviver com Batiatus e sua esposa. A história teria que se restringir ao cenário dos alojamentos dos escravos e aos personagens que convivem diretamente com Spartacus, mostrando Batiatus e sua esposa apenas no momento em que eles aparecem no balcão ou mandam chamar o escravo para um diálogo.  

Um dos problemas de séries de ação em geral é sua superficialidade dramática, muitas vezes mascaradas com personagens fortes. Um bom desenvolvimento dramático traz personagens que conduzem a história, não importando quem eles sejam dentro da trama; lutando com unhas e dentes por seus objetivos, fazendo jus às personalidades que lhes foram dadas, tornando seus objetivos e sonhos reais. Mas, em "Spartacus", temos uma história que manipula seus personagens, muitas vezes facilitando sua vida para que ele continue a existir.
Temos como exemplo o próprio Spartacus, a quem os roteiristas pouparam-lhe a vida sempre que necessário, forçando as decisões e justificativas dos personagens que tinham esse poder.

Outro exemplo é o de Ilithyia, uma personagem forte que tem o poder de mudar o rumo da história, mas que tomou decisões forçadamente necessárias para que a trama tomasse o rumo desejado pelos roteiristas. Sua rendição aos desejos de Lucretia, depois que esta a testemunhou matar Licinia, foge às características da personagem. Visto que a princípio ela se viu manipulada por seu próprio choque, Ilithyia não tinha motivos para ceder aos desejos de sua chantagista depois de recuperada, já que não havia provas de fato contra ela.

Até mesmo a cena em que convencem seu marido de que a esposa é uma assassina, também foi uma opção dos roteirsitas em forçar a situação para que a história pudesse seguir o rumo planejado. Em um desenvolvimento de roteiro mais aprofundado, o marido não se deixaria manipular tão facilmente, afinal, se trata de um oficial do exército, acostumado a tentativas de chantagens e subornos.


A opção em se restringir a história a um único ambiente/grupo faz com que as interpretações caricatas se destaquem. Vários atores estão atuando nesse linha, mas aquele que mais comprometeu a série foi John Hannah. O ator interpreta Batiatus, aquele que se apresenta como o cérebro de todo mal; que tem o poder de mudar o destino de cada um dos demais personagens e que seduz Spartacus com uma falsa amizade.

Em função de sua importância na história, ele tem maior exposição que os demais, especialmente nos últimos episódios; no entanto, sua atuação fica comprometida pela caricatura. Não estou querendo dizer que todas as atuações caricatas são condenáveis. Existem aquelas que além de caírem no gosto do público, também roubam a cena e se tornam positivamente memoráveis. Temos como exemplo Jonathan Harris em "Perdidos no Espaço", ou Peter Ustinov em "Quo Vadis". Mas isso somente é possível quando o ator propositalmente assume uma postura caricata, manipulando-a a seu favor. Não é o caso de John Hannah, que visivelmente se coloca com uma atuação dramática a qual escorrega na caricatura; com isso, ele não domina nem uma, nem outra.


A produção da série está nesse momento em suspenso. O ator Andy Whitfield, intérprete de Spartacus, foi diagnosticado com câncer e encontra-se em tratamento na Nova Zelândia. Renovada para uma segunda temporada, a série ainda não tem previsão de retorno. Planeja-se a produção de uma minissérie, a qual poderá apresentar as origens de personagens como Batiatus, Crixus ou mesmo Varro. Uma decisão final ainda não foi tomada. De qualquer forma, quando for produzida, a segunda temporada terá um novo elenco de apoio e uma história que deverá se concentrar ainda mais nas cenas de ação, visto que irá apresentar a formação do exército de gladiadores enfrentando o Império Romano. O título da série também irá mudar; já que cada temporada terá um subtítulo diferente. A primeira chamou-se "Spartacus: Blood and Sand", e a segunda foi batizada de "Spartacus: Vengeance".

Comentários

Anônimo disse…
Não acho que a séria tenha tido uma "superficialidade" nos dramas pois a serie chama SPARTACUS BLOOD AND SAND, retrata gladiadores e não mocinhas... Retratou a vida de Spartacus onde foi mto bem explorada na primeira temporada e ainda deixou brechas para que mas para frente venha a descobrir a origem de crixus, doctore e outros personagens... Se a série fosse tão "manipuladora" com os personagens Varro não tinha morrido, pois ele era um apoio para spartacus... Pra mim como serie de ação está indo muito bem.
JeffBRunosc disse…
Também "senti" falta de mais cenários e de mais personagens(complexos ou não). Comparando com ROMA, os seus gastos com cenário/manutenção custaram o cancelamento da série e a ideal história que o passado de Roma merecia. Algo que tem que ser cuidadosamente elaborado, pois eles vão marchar por toda Roma.

Achei interessante Spartacus perder todos os laços afetivos (mulher + amigo), o que deu mais sentido a sua revolta, ainda que esse tema seja bem superficial. Na qual foi apresentada, no final, bem forçada. Mais achei muito boa a coreografia das lutas, a violência (mesmo que forçada, as vezes) a ascenção do Batiatus (passando literalmente por cima de todos!), e as supresas corriqueiras de toda série de TV.

A nível de chegar ao padrão HBO e AMC é impossível. Espero está enganado, mas...
Rafa Bauer disse…
Não vi essa série, pelo fato de ter sido tão massacrada pela crítica. Talvez eu dê uma chance.

Eu vi a estreia de Gravity, outra série do Starz, e gostei muito. Essa sim, eu vou acompanhar.
Unknown disse…
p*** adorei a atuação do John Hannah, achei (por esse lado) ruim ele ter morrido. :(
Lorão disse…
Lorão.

Entrei na série sem conheçe-la. Sem saber o que encontrar de fato. No decorrer dos epsódios fui ficando cada vez mais petrificado com as lutas, mulheres, cenário e a trama. Aguardo anciosamente o início da segunda temporada, visando o confronto entre Spartarc x Roma. Vai prometer!!!
Foxdown disse…
quanto tem a seguanda mesmo?????
Anônimo disse…
Amo o seriado, acredito que as críticas são de pessoas que não assistiram e ficam julgando pelas fotos...
Anônimo disse…
A SÉRIE É OTIMA, QUEM NÃO OLHOU NÃO SABE O Q ESTA PERDENDO!!! NAO VEJO A HORA DE COMEÇARA SEGUNDA TEMPORADA.......................

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