Daktari e a Preservação da Vida Selvagem


Por Fernanda Furquim

Em uma época em que a preocupação com o meio ambiente e a vida selvagem ainda não dominava a mentalidade social, e que nomes como Jacques Cousteau ainda construíam sua reputação, surgiu na televisão americana um produtor que dedicou toda sua carreira à conscientização dos telespectadores à preservação da vida selvagem. Seu nome era Ivan Tors, um húngaro que migrou para os EUA na década de 1950.
Ele iniciou sua carreira na TV produzindo séries como “Aventura Submarina” e “Os Aquanautas”, ambas explorando as filmagens submersas. Mas foi na década de 1960 que seu trabalho ganhou mais popularidade, especialmente entre as crianças, ao produzir as séries “Flipper” e “Daktari”. Enquanto a primeira manteve as histórias em torno de um golfinho, a segunda ampliou a área de atuação de Tors, que saiu da água para enfrentar os animais selvagens da África.
Ivan Tors (E)
O continente virou alvo de Hollywood na década de 1960, quando começaram a surgir notícias sobre as revoltas armadas que ocorriam no local. Produtores e diretores, cansados do mundo de fantasia no qual viviam em Hollywoood, voltaram suas atenções às questões sociais do continente. Muitos atores também passaram a defender a preservação dos animais em seu hábitat natural.
Defensor ferrenho da vida selvagem, Tors passara anos lutando para conscientizar o público americano da importância da preservação das espécies animais. Quando estas questões viraram moda em Hollywood, Ivan Tors já estava pronto para explorar o tema na TV. “Daktari” foi produzida com esse propósito.
Criada por Tors em parceria com Ralph Helfer, a série é uma versão televisiva do filme produzido pela dupla, “Clarence, o Leão Vesgo”, de 1965. Com história de Art Arthur e Marshall Thompson e roteiro de Alan Caillou, o filme foi dirigido por Andrew Marton para os estúdios MGM.
A ideia surgiu quando Marhsall visitou o África USA, parque de vida selvagem em Los Angeles mantido por Tors e seu sócio, Ralph Helfer. O local abrigava mais de 500 animais de diferentes espécies, servindo de locação para quase todas as produções que abordavam esse tema.
(E-D) Em pé: Ross Hagen, Cheryl Miller,
Hari Rhodes, Erin Moran e Marshall Thompson, ajoelhado.
Entre os animais que Marshall conheceu estava um leão que, por ser vesgo, nunca era escolhido para aparecer nos filmes. Batizando o animal de Clarence, Marshall escreveu o argumento de uma história que girava em torno de um veterinário tentando encontrar a cura para o problema do leão. Quando Tors leu o texto, decidiu produzir o filme.
O sucesso de público fez surgir a adaptação para a TV, estrelada basicamente pelos mesmos atores e exibida pela rede CBS entre 1966 e 1969, com um total de 89 episódios.
A palavra Daktari  significa doutor em suahili. No caso, um veterinário que vive na África e dirige um centro hospitalar chamado Wameru Study Center, onde realiza experiências sobre o comportamento animal.
Neste centro vivem o doutor Marsh Tracy (Marshall Thompson) e sua filha Paula (Cheryl Miller), além de Jack Dane (Yale Summers) e Mike (Hari Rhodes), seus assistentes, Bart Jason (Ross Hagen), um ecologista que serve como guia de safáris e a pequena Jenny (Erin Moran), uma menina de sete anos, órfã, que foi acolhida pelos Tracy. Outro personagem da série é o britânico Hedley (Hedley Mattingly), um oficial da polícia local.
No filme, o dr. Tracy precisa lutar contra o sistema social que vê os animais selvagens como meio de diversão e lucro. Na série, este ataque ao sistema é suavizado, mas a luta em preservar as espécies e ressaltar sua importância para o ecossistema é mantida.
(E-D) Em pé: Hari Rhodes, Hedley Mattingly, Chryl Miller;
ajoelhados: Marshall Thompson (D) e Yale Summers (E) 
Os personagens convivem com os mais diferentes tipos de animais, sendo que Clarence, o leão vesgo, e a chimpanzé Judy, foram adotados como animais de estimação. Por curiosidade, a chimpanzé Judy é a mesma que foi vista nas séries “Perdidos no Espaço” e “Lancelot Link”, na qual interpretou a agente secreta Mata Hari. Criada no África USA, Judy era capaz de entender 75 sinais diferentes da linguagem surdo-mudo.
A receptividade de público de “Daktari” levou Tors a produzir outra série com o mesmo tema: “Cowboy na África”, entre 1967 e 1968, estrelada por Chuck Connors, na qual temos um americano mantendo um rancho no Quênia.
Ao longo dos anos, a Ivan Tors Films continuou a produzir histórias voltadas para a preservação animal. Depois de “Daktari”, Tors ainda produziria “Salty”, série que seguia a linha narrativa de “Flipper”, desta vez estrelada por uma foca. Em 1983, Tors veio ao Brasil, em busca de locações para seu novo projeto. Mas, durante sua estadia no Mato Grosso, o produtor faleceu aos 66 anos.
Após sua morte, a Ivan Tors Films continuou seu legado por mais alguns anos. Mas, aos poucos, a produtora foi deixando o tema da vida selvagem de lado, levando a empresa a trabalhar com histórias que nada tinham a ver com sua origem. Na década de 1990, ela mudou seu nome para Greenwich Studios.
(E-D) Yale Summers, Hari Rhodes, Hedley Mattingly, Marshall Thompson e Cheryl Miller, com a chimpanzé Judy.
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Texto originalmente publicado em 2011 no blog Nova Temporada da VEJA.com, onde fui colunista entre 2010 e 2016.

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