Resenha: Dexter - 1ª Temporada

O canal Showtime vem investindo nos últimos anos em produções de séries que tenham como tema situações ou personagens que choquem o público. O Showtime tem como objetivo desbancar a HBO a qual vinha reinando desde os anos de 1990 com produções de séries com acabamento cinematográfico. Entre as produções do Showtime, destaca-se “Dexter”, uma série com base em livros escritos por Jeff Lindsay, pseudônimo do autor Jeffrey P. Freundlich, especialista em livros de mistérios e casado com a sobrinha neta de Ernest Hemingway.

“Darkly Dreaming Dexter” foi publicado em 2004, seguido de “Dearly Devoted Dexter” em 2005. No ano seguinte, estreou a série que teve sua primeira temporada baseada no livro um. Mas o que faz de Dexter um personagem tão especial ou a série uma produção diferenciada das demais até agora? Dexter (Michael C. Hall), o herói da história, é um assassino em série. Escolhe, planeja e executa suas vítimas com requintes de crueldade. Até o momento o público vinha acompanhando séries sob o ponto de vista do policial que dedica-se a capturar criminosos como Dexter. Este personagem aparece na série na figura do sargento Doakes (Erik King): dedicado, honesto, não se deixa enganar facilmente, de poucos amigos mas leal, cumpre a lei e prende o bandido.

Curiosamente, a figura tradicional do herói das séries é representada por um ator negro, raça que sempre precisou lutar para conseguir interpretar o herói. Agora que eles conseguiram fugir do estereótipo de bandido, as séries fazem uma inversão de valores e transforma o criminoso em herói.

Visto como uma aberração até então, o assassino em série é posto agora sob a lente de aumento, tornando-se o personagem principal com o qual o público terá de conviver. Por isso, tanto nos livros quanto na série, Dexter precisou passar por restrições que estipula certos limites no comportamento do personagem, além de justificativas que inspire laços afetivos do público para com ele. A audiência precisa se identificar com o personagem de uma forma positiva e, assim, acompanhar suas histórias a cada semana.

Desta forma, tanto a série quanto os livros são narrados na primeira pessoa. Dexter compartilha com o público suas dúvidas, seus medos e seus prazeres. Para não parecer que busca por apoio, ele utiliza-se da ironia e da sinceridade, mesmo que a verdade possa chocar, ao menos, está sendo honesto com o público. A história também introduziu uma justificativa humana para a condição de Dexter, além de apresentar em flashbacks sua formação como assassino em série.

Ele foi adotado por um policial quando ainda era quase um bebê. Tendo vivido um trauma que bloqueou seus sentimentos, é incapaz de se relacionar com as pessoas ou a sociedade. Além disso, sente compulsão em matar, quase uma busca instintiva de uma reação interna que o faça perceber que é capaz de ter prazer ou emoções humanas.

Nos flashbacks ainda testemunhamos a preocupação de seu pai adotivo quanto ao futuro do filho, além de ver no personagem, ainda criança, a confusão e a ingenuidade típicas de um adolescente em fase de crescimento e descobertas.

Para salvaguardar o filho, seu pai lhe ensina um código de conduta, que representa as regras sociais e de comportamento que todo pai ensina ao filho. Sendo policial, seu pai lhe ensina como evitar ser descoberto, além de lhe impor que suas vítimas sejam somente pessoas iguais a ele. Jamais matar um inocente, apenas assassinos. Desta forma, temos na série a utilização da justiça com as próprias mãos, algo que já vinha sendo abordado há algumas décadas e já aceito pelo público.

Tendo o símbolo do sangue como elo de ligação com seu passado e com sua família, Dexter trabalha como especialista no laboratório da polícia de Miami, Flórida. Ele analisa as amostras de sangue encontradas nos locais dos crimes que a polícia investiga, ajudando, assim, a manter a justiça e as aparências.

Mas isso também é uma desculpa para dedicar-se a algo que o fascina, o sangue. Trabalhando no departamento de polícia, ele tem acesso a casos criminais. Capaz de identificar um assassino em série, Dexter vai à caça sempre que precisa satisfazer sua “sede”. Capturando o criminoso, ele dá início a um ritual quase satânico, no qual esquarteja suas vítimas ainda conscientes.

Antes de matar, relata para a vítima sua lista de crimes para que ela e o público saibam o porquê dela estar sendo sacrificada. Para cada morte, Dexter separa uma amostra de sangue que irá fazer parte de sua coleção.

Personagens como Dexter eram vistos nas séries de TV como a figura do vampiro, dominado por uma força maior que ele, que tem no sangue um símbolo de sua vida eterna e prazer. Na década de 90, o Canadá produziu “Maldição Eterna/Forever Knight” que traz para a TV um vampiro moderno trabalhando no Departamento de Polícia de Toronto.

Ele usa sua profissão como meio de se redimir de seus crimes milenares. Tentando controlar uma força interna, ele é descoberto pela legista do necrotério que se alia a ele em sua luta para vencer seu lado negro. Seu maior inimigo, no entanto, é Lucien De La Croix, o responsável por tê-lo transformado em vampiro e que tenta a todo custo fazer com que Knight se una novamente a ele, abandonando seu “código de conduta”, tal qual Dexter e sua contraparte, o assassino do caminhão de gelo que aparece nesta primeira temporada da série.

Os demais personagens do elenco são Deborah (Jennifer Carpenter), irmã de Dexter, que ignora seu segredo, mas desde criança testemunhou a dedicação de seu pai legítimo, pelo irmão adotado. Ela cresceu carente de afeto e tem no irmão sua única família. Por isso, faz de tudo para manter uma relação com ele tal qual o pai faria ou desejaria.

Deborah é ingênua, gosta de fato de Dexter, mas não consegue criar com ele os mesmos laços que seu pai criou. Ao contrário do irmão, ela é governada pelas emoções e não pela razão. Ainda nessa primeira temporada, Deborah passa de policial à Detetive. Sua baixa auto-estima sofre um novo revés quando ela é submetida a um novo trauma emocional.

Angel Batista (David Zayas) é o detetive latino. Boa praça, bem humorado, dedicado ao trabalho, passa por problemas em seu casamento, os quais ele tenta esconder dos colegas de trabalho. O sargento Doakes (Erik King) é o profissional de carreira. Busca resultados, é metódico e exigente. Pretende chegar ao topo de sua profissão. Ele é ex-parceiro de Maria LaGuerta (Lauren Vélez), que agora é chefe do departamento da homicídios.

Os dois mantém um forte laço de amizade e confiança. LaGuerta não suporta Deborah e tenta desmerecer seu trabalho e suas atitudes sempre que possível. Ela está interessada em Dexter, com quem vive flertando. Mas, Dexter não tem interesse no sexo ou nos relacionamentos de casais. Aprendeu com o pai a fingir sociabilidade para não levantar suspeitas. Por isso, tirou a sorte grande quando conheceu Rita (Julie Benz), mãe de dois filhos, que sofreu freqüentes abusos do ex-marido e que agora mantém uma relação com Dexter sem sexo.

Todos esses personagens apareciam como pano de fundo nos livros. Para trazer a história para a TV, eles ganharam maior participação na trama que, apesar de ser sustentada por Dexter, necessitava de um ambiente familiar ao público para suavizar o lado negro do personagem. O fator psicológico que movimenta Dexter ainda está no comando, mas divide espaço e relação com os demais personagens. Nesta primeira temporada, temos Dexter sendo desafiado por um assassino em série, batizado de “Ice Truck Killer”.

Admirando seu trabalho, Dexter divide-se entre ajudar a prende-lo ou aprender com ele, que conhece seu segredo e o desafia constantemente a adivinhar seu próximo passo. Ao final, Dexter irá descobrir que existe uma longa história por trás das mortes causadas pelo “Ice Truck Killer”. Descoberta esta que fará com que Dexter entre em contato com emoções e lembranças há muito escondidas e exija dele um aprendizado rápido para saber como lidar com elas sem se expor demais.

A relação de Dexter e Rita também se desenvolve ao longo desta temporada a ponto dele se comprometer ainda mais com a jovem que deveria servir apenas de fachada. A primeira temporada de “Dexter” tem apenas 12 episódios, número que segue os padrões de produção dos canais a cabo.

Destaque para os episódios “Father Knows Best”, título que faz referência à sitcom dos anos 50, “Papai Sabe Tudo”. No episódio, Dexter entra em contato com seu passado e descobre novas informações sobre seu pai e suas razões para protege-lo. E ainda “Truth Be Told” e “Born Free”, os dois últimos episódios da temporada, que traz o desfecho da trama apresentada nessa fase e leva o personagem a um novo patamar em sua existência.

(Texto também publicado aqui).
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