Emmy 2009: Comentários

Elenco de "Mad Men"

Realizado mais um evento é hora de comentá-lo. Ler as notícias no dia seguinte é uma experiência interessante, não apenas para constatar que um texto praticamente copia o outro, mas também para ver o quanto as pessoas precisam usar termos e palavras de revolta para afirmar sua posição em relação a algo que já se sabia de antemão.

A não ser que vivam em outro planeta ou liguem a televisão só para se divertir, os críticos não têm absolutamente nenhum motivo para se sentirem revoltados com o resultado de ontem à noite nas categorias principais do prêmio Emmy. Com exceção de três zebras, os demais vencedores já eram aguardados.

É preciso deixar claro que estamos falando de um prêmio oferecido pela Academia de Televisão, a qual foi moldada em todos os sentidos à imagem e semelhança da Academia de Cinema; e que vem desde seu surgimento no final dos anos 40 reafirmando sua proposta e seu perfil original, que é o de manter uma postura tradicional, tal qual ocorre com as academias de cinema, artes plásticas ou literatura.

Todas seguem um princípio básico de acordo com aqueles pregados pela sociedade e cultura na qual está inserida. As mudanças são lentas, o que se torna até um mal necessário, já que a tão desejada inovação, encontrada em prêmios alternativos, incorre no risco de não ter a mesma respeitabilidade que a Academia tem junto à comunidade.

Enrolação? Não exatamente, afinal, é preciso ter conhecimento do básico para poder julgar seus atos. De nada adianta exigir um comportamento "assim ou assado" de "alguém" que não têm a personalidade voltada para isso.

Ao ler comentários publicados sobre o resultado da entrega do Emmy 2009 me veio a impressão de que as pessoas estão confundindo Emmy com Oscar, no qual temos um filme diferente vencendo a cada ano. O Emmy premia séries, entre outros programas, e estas duram anos com temporadas compostas de, pelo menos, 22 filmes cada. A não ser que a produção despenque em sua qualidade ou que outra surja com um desenvolvimento superior, a tendência é premiar a mesma produção. É mais fácil ter rodízio entre atores que entre as séries.

Kristen Chenoweth

É certo que a forma como ele é avaliado é questionável, visto que são pessoas que não têm tempo para assistirem tudo (ainda mais se aumentam o número de indicados por categoria), e que também têm suas preferências. Qualquer pessoa que já tenha participado de alguma banca de jurados tem uma pequena noção dos bastidores do Emmy. É por isso que são oferecidos apenas dois episódios como amostra do trabalho de uma série (os atores têm um episódio para avaliação). Mas isto não impede de que a pessoa que está avaliando já não conheça a série ou as concorrentes.

A crítica por "Mad Men" ter ganho de novo fez surgir comentários como "já chega". Mas devemos lembrar que este é apenas o segundo ano que "Mad Men" ganha (não confundam Golden Globe e outros prêmios com o Emmy). Se uma produção com a qualidade comprovada da série ganhasse o Emmy apenas uma vez, aí sim teria algo errado. Mas, duas? É absolutamente normal.

Nesta época de rapidez, de notícias que têm validade por apenas cinco minutos (que já é muito), da impaciência em esperar, e do interesse de só ligar a televisão se for para ser surpreendido, exige-se que o Emmy não contemple uma produção duas vezes, ao menos, não seguida. Se fosse de vez em quando talvez as pessoas não reclamassem, porque daí soaria como novo.

O que dizer de "Frasier" que ganhou 6 anos consecutivos, ou "Chumbo Grosso/Hill Street Blues", "Comédias Dick Van Dyke" e "The West Wing" que ganharam 4 anos seguidos? Reclamam que "30 Rock" não deveria mais ganhar, isso porque é a terceira vez seguida que leva o prêmio de melhor comédia. Sendo que ainda tem "Nos Bastidores da Lei/L.A. Law", "Mary Tyler Moore" ou "Tudo em Família" que também levaram o prêmio três anos seguidos. Menciono apenas as séries, pois na categoria atores Candice Bergen e Helen Hunt abocanharam cinco Emmy cada, de melhor atriz em comédia (embora Bergen não tenha sido consecutivo, mas Hunt foi). E ainda tem o talk show de Jon Stewart que ontem ganhou pelo sétimo ano consecutivo.

Elenco de "30 Rock"

"Mad Men" faz companhia a cinco outras produções que também levaram o prêmio dois anos consecutivos. Ano que vem a série deverá enfrentar fortes concorrentes com a estréia de novas produções que estão chegando na próxima temporada e na mid-season. Mas sabemos que no fundo a revolta não é pelo fato da série ter ganho dois prêmios consecutivos, mas por ser "Mad Men", que não tem público. Se fosse "Lost", "House", "Dexter", ou outra mais popular a maioria não acharia nenhum problema. Então chegamos na questão: mas e os outros, não têm chance?

Gosto do período anterior à entrega do prêmio, em que são anunciados os indicados os quais passam a ser vencedores por pelo menos um mês. Por que é isso. Um tem que levar a estatueta. Ninguém vai deixar de assistir a uma série só porque ela não ganhou um Emmy, se fosse assim, a grande maioria das produções que fizeram a história da televisão não teriam existido.

A contínua presença de "30 Rock" no palco, por exemplo, tem uma importância maior do que a série favorita de alguém ganhar o prêmio. Ela representa o peixe que nada contra a maré. Em meio ao esforço contínuo, especialmente em um período de crise, do marketing falar mais alto, tornando-se uma ferramenta formadora de opinião, uma produção cara, sem audiência e sem apelo popular, consegue se manter em uma rede aberta. Afinal, como Tina Fey bem colocou em seu discurso de agradecimento: obrigada por nos manter no ar. Visto que é muito mais fácil para um canal do porte da NBC substituir a série por outra que poderia gerar maior audiência e lucro, ou por um reality ou por um talk show, infinitamente mais baratos de serem produzidos e com um retorno maior.

A Academia já tem um grande problema nas mãos que é a audiência, a qual continua baixa. Os primeiros números divulgados da cerimônia de ontem à noite foram desanimadores: uma média de 13 milhões contra os 12 do ano passado. Isto porque a entrega do prêmio contou com presenças populares como o prêmio a Jon Cryer, o voto popular para "True Blood", o próprio apresentador da noite, Neil Patrick Harris, e a indicação a Jim Parsons, por "The Big Bang Theory". A cerimônia enfrentou a concorrência com um jogo de futebol, algo que desejavam ter evitado. Os organizadores tentaram mudar a data do evento, mas no fim, ficou sendo no mesmo dia do futebol.

Então chegamos ao evento em si. Apesar dos claros esforços de Neil Patrick Harris como apresentador, a cerimônia não ofereceu o espetáculo anunciado. No entanto, foi melhor que a palhaçada do ano passado em que cinco apresentadores de Reality Shows comandaram a cerimônia. Esta manteve-se praticamente na mesma estrutura com poucos momentos interessantes.

Mas para um apresentador, Harris é um ótimo produtor. A troca na ordem das categorias provou ser excelente, tornando o evento mais dinâmico e, ao mesmo tempo, cumprindo com a sua função. Com as categorias separadas em comédia, drama, minissérie, talk show e reality a cerimônia ficou mais confortável de se acompanhar, eliminando-se o vai-e-vem entre os gêneros e formatos.

A cerimônia tomou como tema a campanha "assista à TV e não à Internet", para tanto, buscou auxílio em um personagem que estrelou um curta-metragem distribuído online. É realmente hilário ver a televisão passar nos dias de hoje pelo mesmo problema que o cinema viveu nos anos 50 quando a própria televisão começou a conquistar seu público. Interpretando o cientista Dr. Horrible, Neil Patrick Harris reproduziu no Emmy o mesmo tipo de discurso proferido pelo cinema ao ironizar o fato do público trocar a tela, hoje grande, da TV, pela do computador, que tem o mesmo tamanho que a tela da TV tinha nos anos 40 e início dos anos 50.

Esta foi uma das principais alegações que o cinema levantou junto ao público dos anos 50 para justificar o porquê do cinema ser melhor que a TV (entre outras questões é claro). Me recordo de uma propaganda exibida nos cinemas da época (que eu vi em arquivo, deixo bem claro), na qual Tony Randall mostrava a diferença de tamanho e definição entre a tela de cinema e a tela de TV. Igualzinho ao que Harris fez ontem à noite. A música de abertura do evento já convidava o público a não mudar de canal. Rick Gervais fez côro à campanha ao ironizar o fato de que o evento estava sendo assistido por uma audiência de 5 mil pessoas.

Bryan Cranston

Quando o assunto é audiência, não me envolvo, já que geralmente não me apaixono por séries que atraem as massas. Mas acredito que a melhor forma do Emmy escapar deste problema seria resgatar as categorias Séries de Aventura e Melhor Série Nova, existentes nos anos 50; além de criar uma para Melhor Drama Teen.

Parece muito né? Mas desta forma ele poderia atrair o interesse de um público maior, manter a linha tradicional na escolha da categoria de série dramática e ainda dar opção às produções que não conseguem ganhar o prêmio quando competem com outros que trabalham um desenvolvimento narrativo e de personagens mais aprofundados.

É claro que algumas produções continuariam a não ter chances. Como por exemplo "Dexter", que em minha opinião não leva prêmio porque traz como herói um assassino em série. Se fosse um telefilme ou uma minissérie, não teria problemas, mas é um seriado, que dura anos, criando uma relação afetiva junto ao público, a qual fere os princípios tradicionais da sociedade na qual o prêmio se apóia. Michael C. Hall tem maiores chances que a série, e mesmo assim, acho que só receberá um prêmio no dia que seu personagem entrar em crise de consciência em relação aos seus atos.

Quanto aos atores. Glenn Close, esperada e merecida, não tem discussão. Toni Collette, por "The United States of Tara", levou o prêmio comprovando a tradição do Emmy em escolher atores que trabalham múltiplas personalidades (ou irmãos gêmeos). Não estou criticando a escolha, sou fã do trabalho dela, mas o episódio pelo qual concorreu não explora o talento da atriz, ou lhe garante um prêmio. Collette, como a maioria dos atores e séries que iniciam a carreira no Emmy, escolheu o piloto, em função de ser uma introdução à proposta da trama. Se escolhesse outro episódio, correria o risco de alguém assistir e não ter paciência ou tempo de tentar entender o que está acontecendo; algo que para o fã parece absurdo, mas que na prática ocorre.

Alec Baldwin

Christin Chenoweth por "Pushing Daisies", prêmio merecido, a atriz se destacou em uma série que tinha dezenas de outros elementos para seduzir o público; Alec Baldwin, por "30 Rock", apesar da birra do público em relação às repetições, o sujeito continua fazendo por merecer; e Bryan Cranston é impagável.

As zebras foram Jon Cryer por "Two and a Half Men", que não assisto (só vi a primeira temporada); Cherry Jones, por "24 Horas", atuação que passou despercebida, mas está de acordo com o prêmio; e Michael Emerson, por "Lost". Injustiça com Aaron Paul (favorito da noite) e felicidade para os losters. Entre um viciado e um bandido que se faz passar por herói, a Academia ficou com o segundo. Poderiam ter escolhido William Hurt, por "Damages". Como vêem, a tradição permanece, às vezes à favor, às vezes contra.

Comentários

Rapha disse…
Acho que para satisfazer os que assistem vários seriados e gostariam que seus seriados fosse reconhecidos publicamente, a MTV poderia fazer um "VMA" dos seriados! Assim, pessoas impaciente, como eu, veriam Dexter, The Big Bang Theory, Bones, etc, serem premiados!

@raphag
Unknown disse…
A hora da TV paga

Merece muita atenção o Projeto de Lei 29 que, desde 2007, recebeu centenas de alterações e tem agitado lobbies fortíssimos no Congresso. Os debates já completaram dois anos e prometem chegar a 2010 sem resolução.
Há muitos temas envolvidos, mas dois especialmente importantes: as formas de comercialização dos pacotes e o estabelecimento de cotas de exibição para produções brasileiras em canais pagos.
Pacotes – A falta de liberdade de escolha, impingindo ao consumidor um grupo restrito de possibilidades fechadas, viola a proibição da “venda casada” prevista no Código de Defesa do Consumidor. Os canais são produtos isolados, com materiais próprios, criados por empresas diferentes. Ninguém deve ser obrigado a pagar por um canal que jamais assiste. Os preços devem ser proporcionais às necessidades do assinante.
Cotas - O assinante de TV paga já não tem “liberdade” alguma, a não ser para mudar canais; o oferecimento de atrações alternativas só contribuiria para a heterogeneidade das opções disponíveis. E a defesa da “qualidade” dos produtos estrangeiros é espúria, pois a esmagadora maioria dos programas pagos não passa de lixo anglófono, filmes inclusive. As cotas de exibição existem em todos os países preocupados com a sobrevivência das produções nacionais perante a brutal (e muitas vezes desonesta) concorrência norte-americana. Dentre as outras regulamentações urgentes que ainda precisam ser impostas à TV paga, esta é a menos controversa.
As discussões do PL já tiveram alguma visibilidade, mas recentemente mergulharam num perigoso silêncio. A imprensa assobia, os exibidores bravateiam, os produtores cochicham e os artistas correram para a praia, capachos espertos que são. É sinal de que alguém andou metendo caroço no angu. No mínimo criando instrumentos para fortalecer do monopólio de produção e comercialização de Globo Filmes e afiliadas.
Moisés disse…
Fernanda, no começo do segundo parágrafo houve erro de digitação: linguem, ao invés de liguem.
No começo do quinto saiu "Enrrolação".
Fernanda Furquim disse…
Obrigada Moisés!!!!
Unknown disse…
Não acho que Dexter deixa de ganhar por ser amoral, se fosse assim, Breaking Bad não levaria de melhor ator, ne?

Acho que Dexter não é tão boa assim. Ela é aquele tipo de obra em q tds os fatores colaboram para o sucesso de Dexter (ou a série acaba), e isso empobrece a obra.
Fernanda Furquim disse…
Um voto a favor de Breaking Bad como melhor ator é o fato dele estar fazendo o que faz contra sua vontade. Não existe um prazer mórbido em suas ações.
Mica disse…
Posso fazer uma pergunta nada a ver com o texto? Como faço para colocar aquele gadget do pintinho do twitter em um blog? Achei muito fofo, mas sou nova nessas coisas e não sei fazer.
Desculpe a intromissão...depois comento melhor o texto em si, ok?
Fernanda Furquim disse…
oi Mica, é só salvar a foto, depois ir até o layout, escolher na gadget a opção picture e incluir a foto e o link. Qualquer dúvida é só perguntar. Abraços!
Unknown disse…
Acho que inicialmente o Walt foi meio forçado. Contudo, no decorrer da história, ele mostrou sentir um prazer de ser reconhecido pelo cristal azul mais do que conseguiu como professor. E ao contrario do Dexter, que "limpa a sujeira", Walt "faz a sujeira".

Mas, acho que vc tem razão, no sentido, que Dexter é mostrado como um heroi carismatico. Já Walt não tem esse glamour em Breaking Bad.
Rapha disse…
Ok, talvez Dexter ainda não esteja digno de emmy (embora eu queria muito que ganhasse). Mas eu acho que o Jim Parsons, o Sheldon de The Big Bang Theory, estava sim. Ele tem feito um excelente trabalho no seriado! Achi que ele deveria ter ganhado!

@raphag
Rubens disse…
Sobre este texto do Guilherme Scalzilli ("A hora da TV paga") publicado acima -- e que nada tem a ver com a materia da Fernanda, eu apenas gostaria de dizer que sou veementemente CONTRA tudo o que PL-29 tenta implementar que não tenha a ver com a permissão para que as teles entrem no mercado de tv paga.

É vergonhoso eu assinar TV Paga para assistir aos seriados americanos, e ser obrigado, na marra, à força, como uma imposição troglodita, a carregar de contra-peso, em pleno horario nobre, programas nacionais que eu NÃO QUERO ASSISTIR, e não pedi para ter (ou iria procurar a tv aberta e os canais brasileiros).

Ainda bem que existe a internet e os downloads contra essa cambada que adora impor aos outros o que a gente pode ou não pode assistir.

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