Lost Chega ao Fim

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"Lost" acabou, tanto nos EUA quanto no Brasil, onde seu último episódio foi exibido na noite de ontem pelo AXN. Quem acompanha a série pela TV aberta, terá de esperar a boa vontade da Globo, ou então o lançamento da sexta temporada em DVD, prometida para o final do ano. Com o fim de "Lost", encerra-se também a década para a televisão americana, período marcado pela forte presença dos reality shows na programação televisiva e sua consequente influência.

A série mais badalada da década surgiu pela influência desse tipo de programa na narrativa seriada. "Survivor" foi uma produção que estreou na rede CBS em 31 de maio de 2000, na qual temos pessoas isoladas em um local remoto tentando sobreviver. Dividido entre duas equipes, chamadas de tribos, os participantes são submetidos a testes criados pela produção, que levam as equipes a competirem entre si. O grupo que perde a prova do episódio da semana, vota na eliminação de um de seus membros. Ao restarem dez participantes, forma-se uma única equipe que segue a regra 'cada um por si'. O vencedor vai para casa rico.

Foto de elenco da 1ª temporada

O programa fez sucesso instantâneo, ganhando várias versões estrangeiras e paródias, tornando-se parte da cultura popular. Um ano antes da estreia do programa, teve início a produção de um filme estrelado por Tom Hanks chamado "O Naufrago/Cast Away", no qual temos um personagem que sofre um acidente aéreo, ficando perdido em uma ilha, sozinho, durante quatro anos. O filme foi lançado em dezembro de 2000, oito meses após a estreia estrondosa de "Survivor".

Embora a rede ABC aponte "O Náufrago" como referência direta para a criação de "Lost", não há dúvidas de que o reality show "Survivor" tenha sido o verdadeiro responsável. Seu sucesso pela emissora concorrente, a CBS, era uma ameaça a qualquer tipo de programa ou série exibida nos demais canais. "Survivor" foi o responsável direto pelo o surgimento de todos os reality shows dessa década, os quais desbancaram a programação seriada na TV americana. Poderíamos até dizer que o próprio filme estrelado e produzido por Tom Hanks, se beneficiou com o sucesso conquistado pelo reality show.

Foto de elenco da 2ª temporada

Em 2003, Lloyd Braun, um dos diretores da ABC, decidiu produzir uma série de TV tendo como referência o filme "O Náufrago", chegando a batizar o projeto de "Cast Away - The Series", o qual foi entregue à Ted Gold, da produtora de Aaron Spelling, a Spelling Productions. Gold contratou Jeffrey Lieber para desenvolver o roteiro e o conceito geral da série. A idéia original era desenvolver uma trama na qual fosse apresentada as tentativas de sobreviver em uma ilha deserta. Lieber teria utilizado como referência o filme "O Senhor das Moscas", o qual teve como base o livro de William Golding. Batizado de "Nowhere", o projeto foi apresentado à ABC, que encomendou o roteiro do episódio piloto.

Mas, Lieber não conseguiu entregar um roteiro que pudesse satisfazer os interesses da ABC, que o dispensou, contratando J. J. Abrams, de "Alias - Codinome Perigo", e  Damon Lindelof, de "Nash Bridges",  para reescrever o piloto. A dupla teria alterado completamente o conceito desenvolvido originalmente, fazendo surgir o projeto e o roteiro de um piloto batizado de "Lost". Após mover um processo junto ao Sindicato dos Roteiristas, através do qual apontou similaridades entre seu projeto e o de "Lost", Lieber conseguiu ter seu nome incluído nos créditos, como um dos responsáveis pela série. 

Foto de elenco da 3ª temporada

A principal diferença entre os dois projetos, o de Lieber e o da dupla Abrams-Lindelof, estava na abordagem fantástica e de mistério, transformando a ilha em personagem principal na qual ocorrem situações sem uma explicação racional aparente. Assim, além de sobreviver a um acidente aéreo, os personagens teriam que enfrentar perigos e desafios originados da própria ilha (criados semanalmente pelos produtores/roteiristas), na qual se faria presente uma outra 'equipe' de participantes, que já teria eliminado a 'equipe' que anteriormente vivia na ilha.

Em 2009, a produção de "Lost" sofreu um novo processo, dessa vez de plágio, movido pelo produtor Anthony Spinner, responsável pela série clássica "Os Invasores", produção que serviu de inspiração para "Arquivo X". Ainda não há informações concretas sobre o adamento do processo. Confira maiores detalhes sobre o caso aqui.


Foto de elenco da 4ª temporada

A primeira temporada ganhou a encomenda de 12 episódios iniciais, entrando em produção sem a presença de Abrams, que na época estava ocupado com o filme "Missão Impossível: III". Para auxiliar Lindelof, foi contratado o produtor Carlton Cuse, criador das séries "Nash Bridges" e "Martial Law", que entrou para a equipe durante a produção do episódio nove. Apesar da fama de Abrams como co-autor e produtor da série, ele, de fato, tem pouco a ver com o desenvolvimento de "Lost" a partir do 13º episódio da primeira temporada. Afastado da produção em função de seus demais projetos, Abrams manteve os créditos de produtor executivo, mas o show foi comandado pela dupla Lindelof-Cuse até o último episódio.

O piloto de "Lost" foi previamente exibido durante a Comic Con de 2004, conquistando de imediato o público presente. A receptividade da série no evento, influenciou os demais canais a utilizarem a convenção para apresentarem seus novos projetos e temporadas, elevando, assim, o número de produções seriadas presentes nesse evento, o qual é realizado em San Diego desde os anos 70.

 Foto de elenco da 5ª temporada

A exibição do episódio piloto pela ABC conquistou uma média de 18 milhões de telespectadores, fechando a temporada com uma média de 15.7 milhões. Renovada para uma segunda, a série registrou a média de 15.5 milhões de telespectadores, chegando à terceira com uma média de 15 milhões. Esta foi a última temporada a apresentar estabilidade na audiência. Foi justamente nessa temporada que os produtores apresentaram a história de Paulo (Rodrigo Santoro) e Nikki (Kiele Sanchez), a qual se tornou a maior falha da série, reconhecida tanto por eles quanto pelos fãs.

A série não conseguiria resgatar a audiência perdida, mesmo apresentando uma quarta temporada diferenciada das anteriores, na qual temos o resgate de alguns personagens que passam a viver novamente em sociedade. A temporada registrou uma média de 13.4 milhões de telespectadores, sendo composta de apenas 14 episódios, em função da greve de roteiristas ocorrida no período. A quinta temporada sofreu uma queda ainda maior, registrando uma média de 11 milhões de telespectadores. A série chegaria à sexta com 12 milhões assistindo ao primeiro episódio e cerca de 13 milhões acompanhando ao vivo o último episódio de "Lost".

Foto de elenco da 6ª temporada

A série teve maior estabilidade pela Internet, veículo utilizado pelos produtores, canal e fãs para disseminar o conteúdo desenvolvido, trazendo novas informações sobre personagens e situações, bem como disponibilizando referências paralelas. A utilização de novas mídias teve início na década de 90, com séries como "Arquivo X", "Xena, a Princesa Guerreira" e "Buffy, a Caça-Vampiros", sendo que "Homicide: Life on the Street", foi a primeira série a ganhar uma webserie paralela, em 1997, a qual chegou a ter um episódio crossover com a produção da TV. Ao entrar no Século XXI, a Fox investiu pesado nas ações paralelas das novas mídias e ferramentas que surgiram na Internet, através da série "24 Horas", embora "Lost" tenha ganho na proporção.

A série explorou vários elementos pré-utlizados na TV, tendo como principais referências (generalizadas) a série inglesa "O Prisioneiro", passando pela sitcom "A Ilha dos Birutas", o drama de curta duração "The New People", criado por Rod Serling no final dos anos 60; utilizando elementos narrativos explorados por "Kung Fu" e "Viagem Fantástica/The Fantastic Journey", ambas dos anos 70; tendo como referência direta "Twin Peaks", chegando ao reality show mencionado no início da postagem.


Ao longo de sua produção, os roteiristas criaram uma centena de situações misteriosas, com o intuito de prolongar a trama, o mistério que envolvia a ilha e o interesse do público pela história. Uma série, para gerar lucro sem custo, precisa ter uma média de 100 episódios produzidos, o que equivale a cinco temporadas. Esses episódios são então oferecidos em pacote às reprises, de onde sai o lucro dos produtores e de atores que têm estabelecido em contrato percentagens na venda da série. "Lost" fechou sua produção com 121 episódios.

Seu principal trunfo é a narrativa não linear. Apresentar a mesma trama com os mesmos mistérios, em uma narrativa linear teria matado a série logo no início, provavelmente na terceira temporada, pois dificilmente os produtores conseguiriam manter o interesse de um grande público por tanto tempo, seguindo uma narrativa tradicional. Primeiro com flashbacks, depois com flashforward, encerrando com flashsideways, que no final revelaram ser flashforwards (o futuro dos personagens após a morte), a série manteve seu frescor por seis temporadas.  


Era humanamente impossível oferecer respostas práticas a todas as dúvidas, grandes ou pequenas, levantadas ao longo da série. Mesmo porque, muitas delas podem ter sido incluídas apenas como signos interpretativos, sem intenção de uma explicação racional. Assim sendo, no último episódio, os roteiristas trocaram a história pelos personagens. Nunca tiveram, de fato, a intenção de oferecer respostas que pudessem contentar a maioria. Assim, os roteiristas e produtores optaram em responder algumas dúvidas acerca dos personagens (situações e relações), dando aos fãs, a quem eles sempre agradeceram pela companhia, uma despedida sentimental.

Mesmo no final, "Lost" apresentou referências com o último episódio de "Contratempos/Quantum Leap", outra série que, junto com "O Prisioneiro" e "Twin Peaks", deixou um ponto de interrogação na cabeça dos fãs: Sam Beckett (Scott Bakula) estava ou não no limbo?


Abaixo, video apresentado no programa de Jimmy Kimmel, exibido logo após o último episódio de "Lost", no qual temos algumas esquetes humorísticas nas quais vemos as tentativas da dupla Lindelof e Cuse em descobrir a melhor forma de encerrar "Lost". Na primeira, temos Jeff Probst, apresentador do reality "Survivor", eliminando mais um participante de "Lost"; na segunda, temos um final que faz referência à última cena de "A Família Soprano".

Na terceira, temos a presença especial de Bob Newhart, em referência ao último episódio de sua sitcom "Newhart", o qual entrou para a história da televisão como uma das melhores ideias de como encerrar uma série. Anteriormente, Newhart tinha estrelado com sucesso a sitcom "The Bob Newhart Show", na qual interpretara o Dr. Bob Hartley.

Pois no último episódio de "Newhart", na qual o ator interpretava um autor de livros, o personagem leva uma pancada na cabeça; na cena seguinte, vemos o Dr. Bob Hartley (Bob Newhart) acordar, virar-se para sua esposa Emily (a falecida Suzanne Pleshette que não estava no elenco de "Newhart") e dizer para ela: "Tive um sonho estranho", revelando que toda a série "Newhart" não passara de um sonho do personagem de "The Bob Newhart Show".

Comentários

Rafa Bauer disse…
Pra variar, mais um post diferenciado do TV Séries. E olha que tô lendo tudo por aí que diz respeito a Lost e seu final.

Eu adorei a série, gostei muito do final, e acho que quem quer resposta pra tudo é o expectador burro, que quer tudo mastigado. Tanto durante a série, quanto no seu final, temos várias possibilidades interpretativas.

Arquivo X deixava em aberto quase todos os seus episódios e nunca foi criticado por isso, sempre foi tido como uma característica da série. Por que com Lost todo mundo cobra mais?

Achei curioso que a última cena foi exatamente como Stephen King disse que a escreveria, há alguns anos, não me lembro se em um artigo ou numa entrevista. Os produtores já homeagearam King durante série e com essa cena final, prestam mais uma homenagem. Até porque, uma das possibilidades interpretativas (pelo menos para mim), é que a série toda não passou de uma fração de segundo na mente de Jack, antes de ele morrer (por um motivo qualquer, não necessariamente uma queda de avião).
Luiz Carlos disse…
Li muitas analisas sobre lost nos ultimos dias...e essa como sempre foi quilometricamente superior!!
Enfim, adorei o final, fiquei extremamente satisfeito. Foi uma série inesquecivel!!
Silvia Freitas disse…
Adorei o final de Lost, pra mim foi muito bom, não fiquei revoltada com a falta de certas respostas que esperávamos e me emocionei com cada um que recordou quem realmente era. Outra igual a Lost, será dificil de aparecer.
Baiano disse…
Parabéns pelo Post! :D

Lost foi inesquecível e por muito tempo não teremos outro seriado com o mesmo impacto.
Vinicius Dimora disse…
Concordo com as falas dos colegas seguidores de Lost e venho elogiar esse texto muito bem escrito.

Gostaria que fosse uma referência para a qualidade de postagens em outros blogs, já que não conseguiremos isso em jornais por ai afora.

Um respeito à série, ao leitor/espectador e ainda manteve a visão de um jornalismo isento. Vou salvar esse post em meus arquivos sobre a série.

Agradeço também pelas referências e citações. Não me lembro de ter visto o final de Quantum Leap. (Será que existe DVD ou ...)

Ligar Lost com Survival é uma relação óbvia que eu nunca pensei. Fiquei me sentindo um tonto.

Flashsideways foi uma palavra que nunca ouvi ou li.

Algumas informações que foram colocadas como iniciativas dos roteiristas, se me perdoa a contradição com o elogio precedente, estão em algum site dos dois? (Parei de vasculhar a net em um pouco depois do Lost Experience. Achei cansativo o excesso de informações e preferi me restringir ao que vi na Tv)

Agradeço de puderem me responder a última pergunta, apesar de eu mesmo me responder para pesquisar na net.

Valdo
Rodrigo disse…
Eu gostei do texto. Foi o único que li na internet que soube abordar a série sem arvoros emocionais de amor ou ódio, e trouxe pontos interessantes de comparação. Parabéns!
Acho que a diferença entre os 90's com arquivo-X e lost, foi o Hype. Com a Internet a audiência (pessoas que assitem) Lost é muito superior do que as que assitiram Arquivo-X. Aquivo-X era um seriado 'elitizado' para geeks/nerds, já Lost pega tanto os geeks quanto um pai de família que nunca leu nada sci-fi. Nada contra ser pop, mas a revolta meio exacerbada de alguns espectadores é irritante. E Lost assim como X-Files foram programas que exige esforço do espectador para tentar entender ou teorizar de alguma forma sobre os tais mistérios 'abertos'.
carlosamorimadv disse…
Oi Fernanda,

Tud bem?

Teria algum problema se eu utiliza-se trechos deste teu artigo no editorial do programa?
Vou fazer referencia a vc e a blog.
Tá?
bjs.

Carlos Amorim
Fernanda Furquim disse…
oi Carlos! Fazendo referência, não tem problema, obrigada!!! bjs procê!
Unknown disse…
Desapontante final. Muitos se queixam sobre o ritmo desta série, mas não podemos negar é que o sucesso era indiscutível, as primeiras temporadas foram os mais recentes de luxo, mas perdeu o contato, eu acho que foi uma excelente série, mas abusou temporadas. Pela forma como seus criadores têm feito o suficiente bons empregos, por exemplo, Damon Lindelof criado com Tom Perrotta The Leftovers que está agora em sua segunda temporada, uma série baseada em um romance sombrio. Enquanto isso J.J. Abrams continua com excelentes e divertidas propostas. Em suma, os criadores de “Lost” são gênios, eu amo o seu trabalho.

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