Por Que a HBO Dispensou Mad Men?

 

(E-D) Joan, Betty, Don e Peggy.

Por Fernanda Furquim



Uma das piores decisões da HBO já entrou para a história da TV americana: o fato de ter dispensado a série “Mad Men” quando seu criador e produtor Matthew Weiner a ofereceu para o canal. Depois que a HBO recusou o projeto, Weiner foi bater às portas do AMC, conhecido por exibir apenas filmes lançados no cinema.

O pequeno canal a cabo aceitou o projeto o qual acabou colocando-o no mapa da TV a cabo e ainda angariando prêmios. O sucesso de “Mad Men” promoveu a produção de novas séries pelo canal, como a também aclamada pela crítica “Breaking Bad”.

Weiner criou a série quando trabalhava como roteirista e produtor na sitcom “Becker”, produção que ele admite em entrevistas não ter gostado de fazer. Para compensar, começou a desenvolver o projeto inicial de “Mad Men”, com o auxílio de Robin Veith, que escrevia tudo o que ele ditava.

Com uma notável memória para fatos, hábitos, cultura popular, movimentos sociais e até mesmo para propagandas veiculadas na época, Weiner transformou sua série em um retrato de um período.



A crítica elegeu “Mad Men” como a sucessora de “A Família Soprano/The Sopranos”. Não por acaso, Weiner foi um dos roteiristas desta série criada e produzida por David Chase para o canal HBO. Chase chegou a interceder junto à HBO para que o projeto fosse aprovado. E nem assim eles aceitaram.

O curioso não é nem pelo fato de não terem percebido o potencial da série, mas o motivo pelo qual o projeto foi recusado. Visto que Weiner nunca tinha criado série nenhuma, apenas trabalhado como roteirista de produções como a própria “Família Soprano”, a HBO resolveu não se arriscar em bancar tão ambicioso projeto. A não ser que Chase concordasse em produzir ou dirigir alguns episódios. A HBO simplesmente tentou garantir o certo ao invés de investir no incerto.

Por um lado, o projeto era de Weiner; por outro, Chase queria se afastar por algum tempo da produção semanal de uma série. É claro que Chase poderia simplesmente assinar a produção e nem sequer se dar ao trabalho de olhar para ela, deixando tudo nas mãos de Weiner. Mas parece que ele não é este tipo de profissional. Quem ganhou foi o AMC. A atual diretoria do canal HBO se recusa a comentar o caso “Mad Men”, que no Brasil é exibida pela...HBO.


Outro que teve sorte foi John Hamm, que interpreta Don Draper. Influenciado por “A Família Soprano”, na qual trabalhou nas três últimas temporadas, Weiner buscava um ator com um tipo físico mais próximo de James Gandolfini. Alguém que não fosse considerado um galã. Surgiu Hamm que se destacou nos testes e ainda assim Weiner continuou procurando por outro ator. Mas ao vê-lo caracterizado como Don Draper, Weiner percebeu que ele era o personagem que passaria por uma desconstrução interna enquanto seu visual externo, perfeito, seria mantido intacto.

Enquanto Hamm se transformava em uma espécie de William Holden, January Jones (Betty) surgiu como uma mescla de Grace Kelly, Kim Novak e Eva Marie Saint atrizes aclamadas por seus trabalhos com os filmes de Alfred Hitchcock. Tendo feito testes para o personagem de Peggy, a atriz e modelo ficou como esposa de Don Draper. Para o papel de Peggy, que tem um visual perpetuado por atrizes como Sandra Dee ou Annette Funicello, ficou Elizabeth Moss, de “The West Wing”. Já Christina Hendricks (Joan) é uma versão de Marilyn Monroe.

Intimista, sensorial, profunda, explorando o subconsciente, a trama retrata o ambiente e o comportamento daqueles que viveram nos anos 60 sem contudo explorar fatos que poderiam transgredir a narrativa da série transformando-a em um semi-documentário.


Perfeccionista ao extremo, Weiner exige que cada detalhe seja o mais próximo possível da realidade, a ponto de sua equipe ter de utilizar nomes verdadeiros das ruas do bairro onde Draper e sua família moram; os horários reais da época em que o trem, que leva Draper para a cidade, funcionava; quais rodovias Draper teria que pegar, na época, para ir à cidade ou que linha aérea fazia o percurso entre Nova York e Baltimore às 21hs de terça-feira de um determinado dia, mês e ano.

Este apego a detalhes pode parecer exagero para aqueles que estão do lado de fora e até mesmo distantes da realidade da época. Mas temos que levar em consideração que a grande maioria do público que assiste à TV atualmente nos EUA ainda pertence à geração baby boom, aquela que cresceu durante as décadas de 50 e 60, e o reconhecimento a estes detalhes são importantes para a identificação por parte do telespectador.

O cuidado de Weiner com sua produção chega ao ponto de proteger a série de vazamentos de spoilers. Algo que os fãs compreendem e aceitam, esperando o próximo episódio para conhecer os novos rumos dos personagens e da trama.


Em sua primeira temporada “Mad Men” mal chegou a um milhão de telespectadores. Mas a reação da crítica provocou uma elevação neste número e a série fechou a segunda temporada com uma média de 1.8 milhões. O final da última temporada conseguiu fechar com pouco mais de 2 milhões. Número considerado baixo para a TV a cabo se levar em consideração que produções mais populares como “The Closer” por exemplo, chega a conqusitar 6 milhões de telespectadores.

Mas “Mad Men” é um exemplo de série que não poderá ser boa se cair no gosto popular; porque significaria que a produção se rendeu aos gostos da massa que busca entretenimento fácil, ação e explicação visual ou em diálogos de tudo o que acontece na trama. Weiner está no comando, controlando o conteúdo desenvolvido, tendo rejeitado várias ofertas e resistido à várias pressões para tornar a série mais popular.

Filmada ao longo de sete dias com um orçamento de 2.8 milhões de dólares por episódio, a terceira temporada de “Mad Men” tem estréia marcada nos EUA par ao dia 16 de agosto.


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Text publicado em 2009 no blog Nova Temporada da VEJA.com, onde fui colunista entre 2010 e 2016.

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