The Alienist – A Série e o Livro
Por: Marta Machado
“No século 19 acreditava-se que pessoas que sofriam de doenças mentais estavam alienadas de sua própria natureza. Os especialistas que as estudavam eram conhecidos como alienistas.”
A morte de um menino prostituto, cujo corpo é brutalmente mutilado, dá início a uma longa, perigosa e angustiante caçada por um assassino serial que assola a Nova Iorque de 1896. Assim podemos resumir The Alienist, a série e o livro. Cada um, no entanto, relata esta trama a sua própria maneira. Os relatos e narrativas de ambos às vezes coincidem, em outras surpreendem (e até mesmo chocam) quem já leu o best-seller de Caleb Carr.
Até o começo dos anos 90, Carr trabalhava como historiador, publicando artigos e livros de não ficção, até ficar fascinado pela ideia de escrever um thriller psicológico, alicerçado nas figuras de dois homens com passados de violência doméstica. Um se torna assassino, enquanto o outro, persegue tais assassinos. Sua trama pretendia responder à pergunta: Como duas pessoas com passados semelhantes poderiam se transformar em indivíduos tão distintos? Ao contrário dos thrillers psicológicos convencionais, Carr estava mais interessado em esclarecer por que o crime foi cometido do que em descobrir quem o cometeu.
Seu próprio passado com certeza serviu de inspiração, pois assim como seus dois personagens (assassino e alienista), Carr também teve problemas na juventude. Sua infância foi marcada por negligência, alcoolismo e surras. Em 1944, quando seu pai, Lucien Carr, estava na faculdade, Lucien matou um homem a facadas e jogou o corpo no rio Hudson, em Nova Iorque. Ele conseguiu provar que estava sendo perseguido por um pervertido e só ficou preso por dois anos. Quando Caleb Carr tinha oito anos, a mãe se divorciou e casou-se com outro alcoólatra, que agregou três filhas de outro casamento a uma família que já tinha três crianças. Aos olhos de Carr, a atmosfera era caótica. Ele se tornou um jovem problemático, cujos colegas de faculdade o consideravam socialmente indesejável. Em 1994, ele fez a seguinte declaração à revista New York Magazine. “O que me chamava a atenção em serial killers era o fato de que por pouco não me tornei um desses caras – a raiva que eles tinham, a forma como a externavam.”
No começo deste ano, uma entrevista concedida à The Strand Magazine traz outra declaração esclarecedora sobre as origens de seu romance. “Eu tinha uma antiga fascinação por todas as formas de violência, de guerras à violência pessoal. Com esta, tive muita experiência na minha vida, seja devido aos problemas com meu pai, seja com as brigas nas ruas de Manhattan. E este interesse eventualmente tornou-se um desejo de entender as raízes da violência. Eu descobri que tinha um interesse particular por perfil psicológico e no trabalho desenvolvido na Unidade de Ciências Comportamentais do FBI em Quantico, Virginia.”
Carr, no entanto, estava determinado a escrever um romance histórico e não um texto cansativo sobre abuso na infância. Decidido sobre seus dois personagens opostos, ele optou por situá-los no passado, em uma época em que a psicologia já fosse vista como uma disciplina independente. Qual seria o período mais longínquo em que ele poderia usar os rudimentos da psicologia forense em ação e diálogos? Seu conhecimento histórico o levou aos anos de 1870, quando William James estabeleceu o primeiro laboratório de psicologia dos Estados Unidos em Harvard. Carr sabia que seria impossível ser um verdadeiro psicólogo no final do século 19 sem ter estudado James.
Para o local, escolheu Nova Iorque, por ser sua cidade natal e para homenagear Theodore Roosevelt, figura histórica que ele admirava, e que na época selecionada para o romance atuava como presidente do comissariado de polícia de Nova Iorque, antes de se tornar o 26º presidente do país. Dessa forma, os dois principais agentes das forças históricas que ele desejava apresentar, ou seja, os avanços da psicologia e a evolução da criminologia em Nova Iorque, poderiam ser colocados na mesma época e no mesmo local como pano de fundo, atuando como amigos ou conhecidos dos personagens principais, cujos caminhos poderiam se cruzar. Para completar, ele precisava apenas de alguns personagens fictícios.
Porém, por melhor que a ideia parecesse, ele sabia que sua editora, Ann Godoff, não aceitaria que ele migrasse da não ficção para a ficção. Sua agente, Suzanne Gluck, também não estava muito confiante. Por isso, ele precisava de um plano para vender a ideia de um romance em vez de um livro de história. Carr decidiu lhes apresentar a ideia como se fosse uma estória real. Ele forjou uma foto do Dr. Lazlo Kreizler (alienista) visitando Roosevelt na Casa Branca, alguns anos após supostamente terem elucidado um crime em Nova Iorque, usando os mais recentes métodos de análise psicológica. Lembrando que em 1992, não era simples como hoje executar tal falsificação sem um computador. Sua agente reagiu bem à farsa. Mas ela temia que Godoff pusesse em dúvida sua seriedade como escritor. Assim como Gluck, a editora adorou sua exposição, mas não entendeu porque ele queria relatá-la em forma de romance. Quando ele revelou que só poderia escrever como romance porque a estória toda era falsa, ela ficou furiosa. Depois, claro, concordou, e por 14 meses, Carr trabalhou no romance.
Mesmo antes de sua publicação em 1994, a trama já havia despertado o interesse de Hollywood. Mas embora Carr tivesse vendido os direitos de seu livro a Paramount, o projeto de passá-lo para as telas só foi realizado em 2017, para a TNT. A produtora executiva, Rosalie Swedlin, ficou fascinada com os muitos tópicos do livro que ainda seriam relevantes para os espectadores de hoje, como imigração, exploração infantil, corrupção e avanços tecnológicos.
De acordo com a vice-presidente da TNT, Sarah Aubrey, The Alienist é a série mais cara da rede. Ela foi filmada na cidade de Budapeste (Hungria), onde construíram uma detalhada cópia da Manhattan do final do século 19 em um cenário que permitia a movimentação das câmeras em 360 graus. A deslumbrante riqueza visual, de fato, transporta o espectador ao passado, especialmente aquele que conhece o livro. Essa especificidade histórica é um dos fatores que atraiu os leitores do romance, que transcorre em uma Nova Iorque exuberante, porém marcada por sórdidos prostíbulos, policiais desonestos e oligarcas corruptos. Estes elementos contribuem para a questão central do drama: o assassino nasceu perverso ou tornou-se perverso pela influência do meio?
Embora impressione pela reconstituição descrita no livro, e apesar de ter praticamente o mesmo enredo, a série optou por fazer uma releitura dos personagens, notadamente do Dr. Lazlo Kreizler (Daniel Brüll) e de Sara Howard (Dakota Fanning), e abordou apenas superficialmente a real posição de Theodore Roosevelt (Brian Geraghty) no momento histórico e na trama.
O livro não se detém em longas explicações de fatos históricos, mas inclui na narrativa e nos diálogos todos os fatores que dão base a uma constatação que leva Roosevelt a solicitar a ajuda sigilosa de um alienista. Milhares de crimes eram cometidos em Nova Iorque, mas a polícia se preocupava apenas com os que envolvessem pessoas ricas e respeitáveis. Assim, não havia na força nenhum interesse em investigar crimes como o de Giorgio Santorelli, jovem prostituto encontrado na Williamsburg Bridge no início do livro e da série. E mesmo que houvesse, nenhum detetive tinha a capacidade de resolver tais casos. E por que Roosevelt precisava de sigilo? É neste ponto que a série opta por não fornecer esclarecimentos, simplificando o enredo de Carr.
Quando Roosevelt assumiu o posto de Comissário de Polícia de Nova Iorque em 1895, ele fez muitos inimigos poderosos por dedicar-se ao combate à corrupção no departamento. A cruzada iniciada pelo Reverendo Charles Parkhurst culminou na criação da Lexow Commission, uma comissão encabeçada pelo Senador Clarence Lexow, que levou à descoberta de um forte esquema de subornos dentro da polícia. A solução do prefeito William Strong foi substituir os membros do comissariado e nomear o reformista republicano Roosevelt como presidente do conselho do comissariado da polícia de Nova Iorque. Um de seus opositores, o ex-chefe de polícia Thomas Byrnes, foi compelido a abandonar a força. Alguns destes elementos, como Byrnes, de fato aparecem na série, mas de forma um tanto desconectada do contexto.
Por causa dessas pressões, Roosevelt não pode abertamente realizar a investigação de jovens imigrantes pobres que se prostituem nas ruas e nos prostíbulos da cidade. Mas ele sabe que precisa da ajuda de gente capacitada. E por isso, ao contrário do que mostra a série, Kreizler não invade o gabinete de Roosevelt exigindo que o comissário aceite sua cooperação. É Roosevelt que solicita a ajuda do famoso Dr. Lazlo Kreizler para secretamente resolver os assassinatos.
Kreizler, como já foi mencionado, foi vítima de violência doméstica na infância, o que lhe deixou marcas físicas e psicológicas, com as quais aprendeu a conviver. Não apenas isso, mas tirou delas sua força e estabilidade emocional. No livro, ele é um homem agradável e racional, não é rude nem arrogante, e não age sob a premissa de sua versão insegura da série de que, sob determinadas circunstâncias, qualquer pessoa é capaz de atos violentos. Parece até mesmo contraditório que um indivíduo que tenha vencido os traumas, crescido e se tornado o mais respeitado alienista de Nova Iorque fosse dado a rompantes descontrolados. O Kreizler do livro jamais teria esbofeteado Sara, uma mulher por quem ele tem grande admiração. Diante de uma tragédia pessoal, o Kreizler da série se refugia na autopiedade, na bebida e na solidão, enquanto o do livro busca conforto na solução do caso que provocou a tragédia.
O motivo para a bofetada é igualmente o resultado desta releitura. A Sara criada por Carr é um personagem com um passado problemático também. Após a morte do pai (em um aparente suicídio), ela ficou internada em um sanatório por algum tempo, uma experiência conhecida por poucos e sobre a qual ela não fala. Questioná-la sobre o assunto é algo fora de questão, pois Sara é do tipo que não leva desaforo para casa. Ela é destemida, autoconfiante e leal. É, portanto, improvável que alguém conseguisse convencê-la a roubar arquivos da polícia, como ocorre na série. Aliás, o roubo nem seria necessário, já que Roosevelt estava determinado a fornecer toda a ajuda necessária a Kreizler. O simples pedido, com certeza, teria rendido uma bofetada, mas esta seria dela em seu incauto amigo John Moore (Luke Evans) pela ousadia de lhe fazer tal proposta. Por muito menos, ela já o havia jogado em um rio.
A Sara da série é insegura, tensa e não tem por Kreizler a consideração e o respeito do personagem no livro. De fato, após Kreizler refutar veementemente sua hipótese de que uma mulher poderia ter representado um papel negativo na vida do criminoso, Sara fica contrariada (e não, injuriada como na série) diante da afronta. Por isso, ela se empenha em descobrir por que um homem tão racional rejeitaria uma hipótese viável. E ela o faz por ser importante para o caso. Ela descobre então sobre os maus tratos sofridos nas mãos de seu pai, mas não o confronta exigindo explicações, como seu personagem faz na série. Sua lealdade a faz conversar com John, e ambos decidem destruir os documentos que, finalmente, esclarecem a insistência de Kreizler na teoria de que o assassino foi atormentado pela figura do pai.
Mas digamos que no livro Kreizler de fato a tivesse esbofeteado. A reação dela certamente não seria procurar refúgio nos braços de John, como acontece em um dos episódios. Ela teria retribuído da mesma forma. E por que os roteiristas inverteram os papeis de John e Sara na visita à casa dos Santorellis? No livro, é Sara, não John, que é confundida com uma enfermeira. No meu ponto de vista, parece mais uma forma de mostrar uma fragilidade que Carr não atribuiu a Sara. Talvez o personagem tenha sido construído dessa forma para causar um certo impacto no final, quando a vemos portando uma pistola e pronta para usá-la. No livro, a pequena Derringer parece ser uma companheira inseparável de Sara, embora a delicada arma não seja exatamente seu tipo favorito, como ela mesma explica de forma bem-humorada quando acompanha Kreizler e John ao teatro: “Não que eu prefira este tipo de arma, mas … nós vamos à opera.”
Outro aspecto da série que chama a atenção é a maneira como o fascínora é apresentado ao espectador. Enquanto na série, ele é visto desde o começo da estória, no livro o vemos apenas no final. Lembram-se do objetivo de Carr? Ele não estava interessado em QUEM e sim no PORQUÊ. Por isso, Kreizler e seu time de investigadores vão pouco a pouco construindo este personagem ao longo de diversos capítulos de forma que, quando finalmente o vemos, é como se já o conhecêssemos. Através do perfil feito a partir das evidências resultantes da investigação, ele gradualmente se transforma em um indivíduo real, de carne e osso. Por isso, nossa primeira visão do assassino é assustadora. Neste ponto não há crítica, apenas uma constatação, pois a série optou por um estilo diferente de desassossegar o espectador, tornando o personagem visualmente presente em diversos locais. Ainda assim, prefiro o medo causado pela presença incerta do criminoso em qualquer lugar a observar Kreizler e sua equipe. A possibilidade de que essa criatura perversa possa estar observando você agora mesmo é de dar calafrios.
Essa intensidade resulta da energia presente na narrativa em primeira pessoa feita por John Moore. A riqueza de detalhes é apresentada de forma ágil, encaixando cada cena na outra sem deixar nenhum vácuo de entendimento, mas sem assoberbar o leitor com excesso de informações. Tudo está lá por um motivo e não é possível prosseguir a leitura sem acompanhar o raciocínio dos investigadores. Mas para obter esta agilidade na série, parte do conteúdo foi sacrificado. Por exemplo, quando os irmãos Isaacsons são introduzidos à trama, parece faltar uma transição entre a presença dos dois detetives no Instituto e o que os levou até lá. Quando Kreizler e Roosevelt se encontraram, o comissário não parecia muito disposto a aceitar sua ajuda, muito menos em oferecer apoio. No entanto, os policiais foram mandados ao Instituto por ordem do comissário para realizar uma autópsia nos corpos de duas crianças assassinadas há alguns anos. Porém, antes que o espectador perceba essa lacuna, ele é absorvido por uma cena de ação, na qual Kreizler repentinamente corre atrás do suspeito pelas ruas de Manhattan. Cena que não consta no livro, pois a presença do assassino é apenas intuída; como já foi dito, ele só é visto no final.
A questão aqui não é exatamente o que falta e sim o que foi modificado. Enquanto na série Kreizler e Roosevelt são personagens claramente antagônicos, no romance, eles têm grande apreço um pelo outro. Por isso, Roosevelt não apenas cede dois de seus melhores detetives ao médico alienista, mas inclusive fornece registros de outros casos de assassinatos iguais. Também não é sem razão que os dois policiais fictícios são judeus, pois quando Roosevelt assumiu o comando da polícia, ele tentou cercar-se de policiais judeus, que ele considerava excepcionalmente honestos e corajosos. Este aspecto dos Isaacsons pode não ser importante para o entendimento e a apreciação da série, mas ele dá um colorido extra à trama e nos situa melhor no contexto histórico.
Também não fica muito claro, nem mesmo após a reunião com o banqueiro John Pierpoint Morgan (Michael Ironside), por que forças poderosas desejam sabotar o trabalho de Kreizler. Mas essa reunião é, de fato, muito esclarecedora no livro. É Byrnes quem resume uma questão amplamente debatida no livro: “Enquanto acharem que é impossível resolver este caso, ninguém poderá ser culpado por não resolvê-lo. A ralé será obrigada a entender que essas coisas acontecem. Não é culpa de ninguém. Meninos se envolvem no crime. Meninos morrem. Quem os matou? Por que? Impossível determinar. E nem precisa. Em vez disso, fazemos as pessoas focarem em uma lição básica: obedeçam às leis, e nada disso acontece.” Se Kreizler não tiver sucesso, e ninguém acredita que ele terá, o caso não resolvido causará descontentamento e agitação nas camadas mais baixas da sociedade, o que não agradaria nem aos ricos nem à igreja, e deixaria a polícia desacreditada.
Outra grande descaracterização do conceito de Carr (POR QUE o crime foi cometido e não QUEM o cometeu) foi a inclusão de um personagem engodo, cuja função é meramente fazer o espectador seguir pistas falsas. Além disso, algumas cenas e subtramas são completamente irrelevantes, como o romance de Marcus Isaacson com uma socialista e as constantes visitas (pessoais, não profissionais) de John a um bordel. Na série, pouco sabemos sobre os criados de Kreizler, exceto que todos cometeram crimes. Tanto Cyrus quanto Mary foram desconstruídos. Ambos cometeram crimes e foram salvos de sentenças pesadas graças a Kreizler, cujos testemunhos conseguiram provar que ambos tinham na verdade sido vítimas de abuso. Contudo, na série eles agem de forma deliberada e excessivamente agressiva diante de ameaças, contrariando a visão de Kreizler, que no livro, os considera pessoas ajustadas.
Até mesmo o ponto culminante da trama, quando Kreizler e o assassino ficam frente a frente, e o alienista finalmente tem a chance de questioná-lo sobre suas motivações, foi reduzido a poucas palavras na série, não dando ao personagem do homicida a dimensão proposta e sustentada ao longo do livro. Enquanto está no controle, o criminoso é um ser perverso que está pronto e ansioso para mutilar sua vítima diante de Kreizler e John. Mas ao ser dominado, ele volta a sua origem oprimida, transformando-se em uma triste figura. Na série, contudo, ele termina sendo apenas um monstro vencido.
No livro, as considerações finais de Kreizler sobre o matador são mais impactantes e menos melodramáticas, sem alusão a Deus nem à dicotomia bem/mal. Seu principal interesse em mantê-lo a seu alcance era a inusitada oportunidade de estudar um criminoso disposto a falar e eventualmente ajudá-lo a descobrir a verdadeira razão de seus atos. Ele também explica a John a relação desse indivíduo com a sociedade, salientando pontos, alguns dos quais são aproveitados na série. Entre outras coisas, ele diz:
“Se uma pessoa qualquer fosse descrever esse homem à luz de seus assassinatos, ela diria que ele é um desajustado, mas nada poderia ser mais superficial ou mais irreal. Ele não poderia jamais virar as costas para a sociedade, nem a sociedade para ele. E por que? Por que ele estava – ainda que de forma perversa – conectado a essa sociedade. Ele era produto da sociedade, a consciência doentia dela – uma lembrança viva de todos os crimes ocultos que cometemos quando cerramos fileiras para vivermos uns com os outros. Ele ansiava pela sociedade e pela chance de mostrar às pessoas o que a sociedade tinha feito a ele. E o curioso disso é que a sociedade também ansiava por ele. (…) Nós precisamos de homens como ele, eles são um depósito fácil de tudo que é sombrio em nosso mundo. Mas as coisas que ajudaram a fazer dele o que ele era, essas nós toleramos. Essas nós até gostamos.”
O objetivo das adaptações talvez tenha sido tornar o conteúdo do livro mais atual. Nesse longo intervalo entre sua publicação e a realização da série, muitas outras produções tanto para a TV quanto para o cinema exploraram extensivamente o uso da medicina forense e do perfil psicológico, que nos anos 90 eram uma novidade. Sem a análise profunda do comportamento do assassino feita no livro, o foco da série é lançado em dramas pessoais, temperados com ação e um pouco de sexo. É bom salientar que o romance é narrado em primeira pessoa, o que nos permite uma visão restrita apenas ao que John Moore sabe e como ele interpreta fatos e pessoas.
São muitas as diferenças entre o livro e a série, mas nem todas são negativas. Algumas são inclusive muito interessantes, como o destino de Joseph, o menino prostituto, amigo de John. Em uma entrevista a The Strand Magazine, Caleb Carr revelou o que pensa sobre a série, afirmando que visualmente, ela é brilhante, mas em termos de enredo, diálogos e personagens, ela retrata seu livro apenas tangencialmente. A estória está correta em geral, mas os diálogos são muito diferentes e os personagens ganharam características novas equivocadas. Além disso, ele achou inadequada a escolha de Brian Geraghty para o papel de Roosevelt. Ele também ficou aborrecido por ter seu nome incluído nos créditos como consultor, pois sua contribuição não foi nem solicitada nem oferecida. E de nada adiantou pedir à produção para retirar seu nome. A questão principal para ele é: “Será que a série é suficientemente boa e parecida com o romance para atrair o público ao livro, permitindo que as pessoas explorem mais os temas que a série apenas menciona de forma rápida e superficial?”
Independentemente de seu distanciamento do romance, a série conquistou uma boa audiência e tem chance de ser renovada. Conteúdo para adaptar, não falta. Existe um segundo livro intitulado The Angel of Darkness (narrado por Stevie), publicado em 1997. E embora Carr não tenha se entusiasmado muito com a versão da TV, ele parece estar contando com o sucesso da produção, pois retornou ao trabalho de Kreizler em outros dois romances que devem ser lançados em 2019: The Alienist at Armageddon (situado em 1915) e The Strange Case of Miss Sara X (abordando a juventude de Kreizler).
Quem tiver interesse em visitar a Manhattan do final do século 19 e acompanhar a busca pelo assassino serial, mutilador de meninos, pode fazê-lo através da Netflix.
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