Nova Temporada Expõe Fragilidade da TV Aberta


A partir de segunda-feira, dia 1º de setembro, inicia nos EUA a nova temporada de séries. Chamada de Fall Season (temporada de outono), este é o período áureo para as emissoras americanas. Tradicionalmente escolhido por ser o período em que os americanos retornam de suas férias e reiniciam suas vidas e atividades, entre elas a de procurar na televisão algo de novo para assistir, as emissoras americanas costumam se preparar durante o ano para este momento.

Mas, este ano a Fall Season será a mais fraca e desinteressante da década. Com pouco mais de 25 novas séries para estrear, a grande expectativa recai no retorno de produções já estabelecidas, muitas delas na TV a cabo. Culpa-se a greve dos roteiristas iniciada em novembro de 2007 e finalizada em fevereiro de 2008, pela baixa qualidade do que está por vir. Pilotos sendo refilmados, elenco mal escalado, reaproveitamento de idéias ou adaptações de clássicos e produções estrangeiras são justificadas como conseqüência da greve dos roteiristas. De certa forma é verdade, a greve promoveu a renovação de séries que já deveriam ter sido canceladas e a estréia de outras que nem deveriam ver a “luz do dia”, mas culpar a greve por tudo isso é, no mínimo, infantilidade e desprezo à inteligência do público, críticos e historiadores da televisão.

A TV aberta vem declinando em sua qualidade desde que TV a cabo começou a subir na preferência do público e da crítica. Isto, aliado às novas tecnologias que vem sendo agregada à produção televisiva, fez com que a qualidade da TV aberta americana ficasse exposta. Estima-se que 55% dos telespectadores nos EUA dêem preferência à TV a cabo, apesar desta ter um volume de produção muito mais baixo, em função do pouco investimento financeiro, e também produzir muitos programas que nem deveriam ter sido levados adiante.

Cada vez mais popular e massificada com a produção de Reality Shows que permitem uma audiência fácil, sem os gastos de uma produção fictícia, a TV aberta vem diminuindo seu investimento na qualidade de programas, que culminaram com a greve dos roteiristas, a qual promoveu o atraso na finalização de pilotos das novas séries. A verdade é que a TV aberta está despreparada para enfrentar as mudanças que este veículo está passando desde o início do Século XXI, o qual trouxe a concorrência com a TV paga e as novas mídias. Os executivos ainda não conseguiram se organizar para agregar e explorar essas mudanças de comportamento e interesses do público em geral.

Dizem que foram pegos de surpresa pela greve dos roteiristas e regularmente se vê declarações à imprensa de executivos responsabilizando o período de greve pelos problemas que esta temporada vive. Mas, a greve estava sendo esperada desde 2005. Com o crescimento das novas mídias e a aproximação do final do contrato, estava previsto um longo período de negociações. O que talvez eles não esperassem era que os Sindicatos tivessem muito mais empenho em defender seus interesses do que o demonstrado no passado quando tinham apenas o VHS como novidade.

O excesso de confiança no veículo já estabelecido e na idéia de que tudo está sob o controle desmoronou. A TV a cabo está roubando a audiência e o apoio do público e da crítica enquanto que a Internet absorve cada vez mais o interesse do público alvo da televisão: os jovens. Estes, por sua vez abertos às novidades e empolgando-se facilmente com o que, para eles, é novo, promovem um sentimento de urgência e necessidade de produzir um volume maior de material inédito que antes não era necessário.

Sem saber como melhor explorar as novas mídias que está formando um novo público, a televisão tenta desesperadamente manter o controle. Com isso, provocaram a greve e promoveram seu prolongamento quando se recusaram a discutir as novas mídias na renovação dos contratos com o Sindicato. Conseguiram. Agora estão com o território livre para descobrir o que fazer com a Internet, mas também estão pagando o preço pelo atraso da produção desta nova temporada.

Esta greve serviu para expor a fragilidade da indústria televisiva americana que se apóia, ou se apoiava, em uma estrutura criada nos anos 50 e que vinha dando certo até agora. Mas com a globalização e as novas mídias intensificando sua presença no mercado, esta estrutura de trabalho não é mais aceitável para os dias de hoje. Os problemas que a TV aberta enfrenta com a nova temporada são um espelho de seus próprios problemas e necessidades de reestruturação. E já que a TV a cabo não chegou a se prejudicar, visto que sua estrutura é outra, sobrou para a TV aberta arcar com o resultado.

Com uma programação desgastada, tendo sucessos antigos chegando ao seu final e produções como Reality Shows e novelas diurnas sofrendo uma queda significativa em sua audiência, a televisão aberta precisará voltar a investir na qualidade de seu conteúdo para competir com a TV a cabo e as novas mídias. O entretenimento puro não garante mais uma audiência, que tem novas opções para passar seu tempo livre. A massificação não dá mais resultado prolongando.

A audiência está cada vez mais impaciente e buscando programas que estimulem seu interesse e isto só se consegue com a exploração de seu conteúdo. Algo que a TV aberta já conseguiu conquistar no passado quando não tinha a concorrência da TV a cabo, mas que, agora, acomodou-se em jogar para a TV paga os programas de qualidade e conteúdo, ficando com as produções que atraem as massas e exploram de forma superficial os personagens e suas situações, com raras exceções.

Com isso, embora aqui também existam exceções, as séries da TV a cabo, que buscam maior investimento em seu conteúdo, são as mais aguardadas pela audiência e pela crítica neste retorno dos novos episódios, provando que, apesar das mudanças, a fidelidade a um bom produto ainda existe.

Comentários

Fernanda, parabéns pelo texto. Olha, essa realidade que você descreve é uma particularidade da tv americana, né? Aqui no Brasil a Rede globo vem resistindo com bons índices de audiência mesmo com o crescimento da tv à cabo. Claro, algumas pequenas mudanças podem ser notadas.Veja o caso da novela das oito da Globo: João Emanuel Carneiro, que escreve a trama, inovou promovendo o desfecho de um grande mistério ainda no início da novela. Talvez seja pela impaciência do público que não tolera mais histórias longas. Isso pode ser um reflexo da influência das séries. Apesar disso, acho que a realidade do Brasil ainda está muito longe do quadro que você descreveu no post acima.
Abraço!
Fernanda Furquim disse…
Oi Ed, obrigada pelo comentário. Mas sinceramente, acho que a TV aberta no Brasil já atingiu esta realidade há mais tempo, desde os anos 90, visto ter se acomodado em uma fórmula de se fazer TV e não investir na diversificação da dramaturgia, optando em jogar todas as "fichas" nas novelas. Já a questão da audiência é relativa, deve-se levar em consideração o custo da TV paga no Brasil, além do nível cultural da grande população.
Unknown disse…
Excelente post Fernanda.

Concordo com você. A qualidade da programação da TV aberta no Brasil vai de mal a pior. Há pelo menos 10 anos. A maioria das Redes tem apostado em programas "populares" para conseguir audiência. Essa estratégia é frágil e só emburrece e desrespeita o distinto público.
Sem dúvida nenhuma o fato da TV a cabo ser caríssima é o principal impedimento ao acesso. Não é falta de interesse ou vontade do público A,B,C ou D, é falta de grana mesmo. É uma demanda reprimida. Se baixar o preço da TV paga a TV aberta fali.

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