Podemos Dizer que Smith & Jones é uma Versão Não Oficial de Butch Cassidy?

(E-D) Pete Duel e Ben Murphy em "Smith & Jones" (Fotos ABC/Arquivo)

Por Fernanda Furquim

A série é uma produção da década de 1970 que, ao estrear, levou a imprensa americana a considerá-la uma versão televisiva não oficial do filme “Butch Cassidy”. As semelhanças apontadas começavam pela ‘profissão’ dos personagens principais, suas personalidades, a amizade que existia entre eles e até a aparência física de Ben Murphy, que foi comparado a Paul Newman.
A produção teve início com um telefilme chamado “The Young Country”, escrito por Roy Huggins (O Fugitivo e Maverick). A história apresentava dois homens acusados de um crime que, após fugirem da lei, conseguem o perdão. No elenco estavam Roger Davis e Pete Duel, além de Joan Hackett, que interpretou Clementine, amiga da dupla. A ideia era transformar o telefilme em série de TV, mas a rede ABC não aprovou a produção.
Então, Huggins (utilizando o pseudônimo de John Thomas James) se uniu a Glen A Larson, que na época realizava pesquisas em antigas publicações e documentos, buscando informações sobre a Agência de Detetives Pinckerton, famosa na virada do século por perseguir bandidos do velho oeste, como Butch Cassidy e Sundance Kid, com o intuito de levá-los à justiça.
Em suas pesquisas, Larson notou a referência a dois assaltantes de bancos a quem o governador tinha oferecido perdão. Em troca, eles se tornaram guardas da ferrovia Union Pacific, a qual eles já tinham assaltado inúmeras vezes.
Aparentemente, era comum na época contratar ex-assaltantes como guarda de banco ou mesmo como xerifes. Quem melhor para proteger os bancos que alguém que sabe como assaltá-los? Com um bom salário, vários pistoleiros se transformaram em xerifes de pequenas cidades do velho oeste, visto que tinham fama suficiente para afugentarem outros bandidos e habilidade para atirar para matar, se necessário.
Hannibal Heyes e Kid Curry 
Assim, os dois roteiristas desenvolveram uma história sobre dois  “excelentes homens maus”, assaltantes de trens e bancos, que decidem se redimir.
Para um dos personagens, foi adotada a identidade de Kid Curry, bandido que de fato teria existido, tendo sido um dos membros do bando de Butch Cassidy. Ao longo de sua vida, ele teria tentado se afastar e viver uma vida pacata, mas sem sucesso.
A série “Smith & Jones/Alias Smith & Jones” estreou na midseason de 1971, após a exibição de um episódio piloto estrelado por Pete Duel e Ben Murphy.
A história foi situada no final do século 19, quando a modernidade começou a chegar ao velho oeste, levando os bandidos da época a passarem por dificuldades na realização de seus ‘trabalhos': cofres de última geração à prova de explosivos e fotografias que poderiam identificá-los com melhor exatidão.
Quando não conseguem abrir um cofre, Hannibal Heyes (Duel) e Kid Curry (Murphy) percebem que é chegada a hora de se aposentar. Afinal, será uma mera questão de tempo até serem pegos por algum xerife ou caça prêmios. Apesar da fama de bandidos, os dois nunca tinham matado ninguém. Assim sendo, Heyes decide pedir o perdão do governador para que possam utilizar o dinheiro que acumularam na compra de um rancho onde poderão viver suas vidas tranquilamente.
O pedido é feito através do xerife Trevers (James Drury, de “O Homem de Virgínia” no piloto e outros atores ao longo da série) que, apesar dos pesares, é amigo da dupla. Mas o governador impõe uma condição: os dois precisam passar um ano vivendo honestamente. Se provarem que conseguem fazer isso, ele lhes dará o perdão total de seus crimes. Entretanto, ninguém poderá saber do trato, pois a opinião pública, em especial a imprensa, não aceitaria facilmente a decisão, comprometendo o governador politicamente.
Sob essa condição, os dois assaltantes de banco assumem a identidade de Joshua Smith e Thaddeus Jones, viajando pelo velho oeste à procura de trabalho. O problema é que, volta e meia, são reconhecidos por alguém e aí precisam fugir e recomeçar em outro lugar. Nesse meio tempo, ajudam as pessoas que encontram pelo caminho.
(E-D) Pete Duel, Sally Field e Ben Murphy

Em participação especial a série recebeu Sally Field, interpretando Clementine, uma amiga da dupla que tinha em seu poder a única foto existente dos bandidos Kid Curry e Hannibal Heyes. Assim, a golpista tentou chantagear a dupla para ajudá-la a ganhar dinheiro fácil.
Como se não tivessem problemas suficientes, Curry e Heyes também precisavam se preocupar com o detetive Harry Briscol (J. D. Cannon), da agência Bravermann, que estava atrás da recompensa pela captura dos dois, embora aceitasse trocá-la por um valor maior que eles pudessem oferecer, mesmo que fosse produto de roubo.
Ao longo da produção de suas três temporadas, a série sofreu uma polêmica e uma grande perda. A polêmica girou em torno da contratação do ator grego Nico Minardos para interpretar o bandido mexicano El Clavo no episódio “Viagem a San Juan”. Quando a comunidade hispânica soube do fato, protestou, alegando que um ator mexicano deveria interpretar o personagem.
A produção ignorou os protestos e produziu o episódio com Minardos. Mais tarde, os roteiristas decidiram trazer o ator de volta em um novo episódio,  “Milagre em Santa Marta”. Novamente a comunidade exerceu pressão. Desta vez a produção cedeu e trocou Minardos por  um ator hispânico. Dizem que, sentindo-se prejudicado, o ator teria se queixado junto ao Sindicato dos Atores, alegando ‘discriminação invertida’.
(E-D) Roger Davis e Ben Murphy
O SAG teria reconhecido os direitos de Minardos declarando que as produções não poderiam restringir os personagens de latinos para latinos, europeus para europeus e assim por diante. A seleção de elenco deveria ser feita de acordo com o potencial do ator e não sua nacionalidade. Assim sendo, seria errado penalizar uma classe para ajudar outra. Como resultado, Minardos seria novamente contratado.
Mas este foi o menor problema pelo qual a produção da série passou. Escalado contra a vontade para interpretar Hannibal Heyes, o ator Pete Duel estava frustrado.
Sob contrato com a Universal e tendo recusado duas outras séries que lhe foram oferecidas, Duel foi obrigado a aceitar “Smith & Jones”.
Quanto maior era o sucesso da série, maior era a frustração de Duel. Apontado como alcoólatra e depressivo, Duel se matou com um tiro na cabeça na noite de 31 de dezembro de 1971.
A notícia pegou a todos de surpresa, visto que ninguém percebera qualquer alteração em seu humor na tarde anterior. A notícia tomou conta da imprensa rapidamente. Faltando quatro episódios para encerrar a segunda temporada da série, começaram a surgir rumores de que ela seria cancelada. Um episódio ainda precisava ser finalizado.
Segundo o livro “The Show Must Go on: How the Deaths of Lead Actors Have Affected Television Series”, publicado em 2008, a Universal teria proposto  à rede ABC cancelar a produção, mas o canal teria negado o pedido, exigindo que a entrega dos episódios fosse feita na data já estipulada, caso contrário processaria o estúdio.
Assim, Ben Murphy foi chamado no dia seguinte da morte de Duel para filmar suas cenas. Roger Davis, que era narrador da série, foi escolhido para substituir Duel interpretando o mesmo personagem. A imprensa condenou a Universal pela rapidez em contratar o substituto de um ator, morto de forma tão trágica. Davis finalizou o episódio que estava inacabado, refazendo as cenas em que Duel aparecia. Para substituí-lo na narração, o estúdio contratou o locutor Ralph Story.
Foram produzidos nove episódios com Davis para a segunda temporada. Renovada para a terceira, a série teve apenas mais 12 episódios antes de ser cancelada. A troca de atores promoveu a fuga da audiência, tirando “Smith & Jones” do ar em 1973, após 50 episódios produzidos.
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Texto originalmente publicado em 2011 no blog Nova Temporada da VEJA.com, onde fui colunista entre 2010 e 2016.

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