O Que Mudou nas Séries de TV Depois dos Ataques do 11 de Setembro?

Os Estados Unidos completaram hoje oito anos dos ataques terroristas sofridos no dia 11 de setembro de 2001. Até este fato, os únicos problemas enfrentados em território nacional eram os econômicos e domésticos. Ataques terroristas ocorriam no Oriente Médio, na Ásia e na Europa, mas não em solo americano. É claro que existiram conflitos que levaram a revoltas populares, bem como ataques isolados de atiradores ou terroristas domésticos que agiam por conta própria.

Mas nunca o país testemunhou um ataque terrorista na proporção que foi o do dia 11 de setembro de 2001 quando dois aviões comerciais, sequestrados por terroristas extremistas, destruíram o World Trade Center matando centenas de pessoas. Suas conseqüências seriam inevitáveis. Toda a sensação de segurança conquistada ao longo de décadas às custas de um complexo industrial militar foi por água abaixo. Expostos em seu próprio país, em meio ao choque do improvável atentado, os americanos começaram a se perguntar: "por que o mundo nos odeia"?

Ao longo dos meses que se seguiram, o povo dividiu-se entre revoltados e chocados; entre aqueles que exigiam retaliação e aqueles que se negavam a reagir na mesma moeda. Temia-se a 3ª Guerra Mundial.

Até sofrer estes ataques, o americano médio acreditava piamente que o mundo o seguia. Que suas crenças e ideologias eram modelos a serem adotados por todos do planeta. Hollywood se empenhou arduamente ao longo das décadas para propagar e perpetuar o "american way of life", a televisão seguiu o cinema.

Até a década de 90, com raras exceções, o herói das séries de TV explorava as ideologias pregadas pelo povo e pelo governo americano. Mas a partir de "Twin Peaks" em 1990, o "american way of life" começou a desmoronar nas tramas das séries de TV. Onze anos depois, o 11/9 intensificou esta abordagem, tornando-a muito mais explícita, profunda e crítica.

A postura mudou e o olhar sobre si mesmos se tornou muito mais realista. As críticas sociais, políticas e culturais se intensificaram e, mais importante ainda, as portas se escancararam para representantes de outras raças, credos e culturas.

Muito embora tenham existido produções que utilizaram os terroristas árabes como substitutos dos vilões comunistas em suas tramas, elas não predominaram como era de se esperar. Ao contrário, a tentativa de fazer as pazes com o mundo através de séries que adotavam personagens de culturas diferentes se contrapôs à realidade americana de fazer guerra com países do Oriente Médio, a qual expôs atos de humilhação e tortura, embora ainda permaneça escondida a real intensidade da preseça dos americanos em território estrangeiro.

Entre as principais mudanças desenvolvidas pelas tramas das séries de TV após os ataques terroristas está a maior abertura para personagens vindos de outras culturas os quais, em sua maioria, são tratados ou vistos como pessoas normais. As diferenças de crenças e ideologias perdeu força, o materialismo e as regras de comportamento sócio-cultural deram lugar às questões mais humanas e pessoais.

As séries apresentam um olhar mais crítico sobre si mesmas na forma como os americanos se vêem e como estão se colocando no mundo. Ninguém está certo ou errado. Além da própria sociedade, o governo, na figura dos senadores e presidente, torna-se alvo de crítica a ponto de ter seus nomes e atos expostos.

Muito embora a realidade possa ainda não ter alcançado a postura que as séries americanas vêm tendo em relação às diferentes culturas, este olhar sobre si mesmos fez com que, ao longo dos anos, ele ultrapassasse apenas as consequências do trauma imediato, para chegar a um nível de avaliação crítica a partir de cada indivíduo.

Algumas destas questões já vinham se desenhando ao longo das décadas, desde meados dos anos 50 e se intensificando na última década; mas devemos lembrar que não chegou à intensidade de exposição crítica que as séries vivem hoje em dia. Antigamente este tipo de produção era a minoria, hoje se tornou a maioria. O público mudou.

No passado existia um fio de esperança para a cultura americana, existia a inocência de se acreditar ser possível corrigir o que estava errado. Hoje a maioria das séries já reconhecem que não tem conserto. Apenas a busca de transformar o dia de hoje melhor que o anterior; de se viver feliz sendo quem é. O ser humano é muito mais complexo do que a sociedade estabelece; seus traumas são mais profundos e cada um reage de uma forma, de acordo com sua individualidade e não de acordo com a ideologia perpetuada pelo modo de vida pregado pelo governo.

No passado a grande maioria das séries olhava para conflitos internacionais com um olhar crítico; como se eles pudessem ser facilmente resolvidos se os envolvidos realmente se dedicassem à paz e à justiça. Hoje a grande maioria das séries mostra que eles já conseguem ver que os EUA não tem um comportamento diferente daqueles que outrora criticavam.

É claro que esta mudança de olhar é influenciada também por outros fatores, que não apenas os ataques terroristas. Apesar do filtro imposto pela censura da época e da própria visão cultural que existia, a televisão vinha desde os anos 50 assumindo a responsabilidade de levar para os lares americanos mudanças de comportamentos, opiniões e notícias com imagens de tudo o que acontecia no país e no mundo.

Hoje é a Internet que tem essa função. Acessando informações em qualquer lugar do mundo, postadas por qualquer pessoa, a visão se amplia, o senso crítico se fortalece. Com a Internet empresas, governos e sociedades tradicionais são expostas diariamente. Correndo atrás, a televisão precisa agregar este comportamento e visão social e cultural.

Comentários

Livio Lee disse…
Muito obrigado pelo texto Fernanda.

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